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Entrevista: Tuyo detalha significados por trás de seu novo disco, “Chegamos Sozinhos em Casa”

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Há anos como um dos nomes mais promissores e inovadores da música alternativa brasileira, a Tuyo se firmou como uma das bandas mais autênticas de sua geração, gravando ao lado de várias de suas referências e ocupando um espaço próprio no cenário.

Em entrevista ao Tracklist, Jean Machado, Lay e Lio Soares conversaram sobre o lançamento do segundo volume de seu novo álbum de estúdio, “Chegamos Sozinhos em Casa”, que apresenta uma versão renovada da banda e propõe novas reflexões sobre a vida adulta e o autopertencimento por meio de suas canções.

“A gente compreende que tem um movimento musical ou artístico em que o artista constrói uma obra pra si, e ela reverbera só nele, faz sentido pra ele, e às vezes a gente não entende nada, não consegue conversar, enfim. E nosso objetivo era justamente o contrário: produzir uma obra pra iniciar uma conversa”, disse Lio sobre a segunda parte do disco. “A gente tinha sempre, não sei se o temor, mas o cuidado de familiarizar o nosso público, as pessoas que acompanham a Tuyo com as mudanças que a gente queria propor”.

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Reforçando o histórico de colaborações do trio, o novo trabalho conta com a participação de artistas dos mais variados mundos, desde Lenine, uma das referências de Lio, até nomes como Drik Barbosa, RDD, Jonathan Ferr e Shuna.

“Eu acho que é a prova que a gente tá colaborando pra que seja possível o fim dessas regras de bolha e de gênero”, afirmou Jean. “A cada vez que eu consigo colaborar com outros artistas que fazem uma caminhada muito parecida, mas em outro universo, eu me sinto maior, sabe? Eu me sinto expandindo”, complementou.


Leia a entrevista com a Tuyo na íntegra:

TRACKLIST: Primeiramente, muito obrigado pela entrevista, Tuyo! É um prazer estar conversando com vocês! Pra começar, queria saber como vocês estão e como vocês têm recebido a repercussão do disco nos últimos dias?

LIO: Obrigada você por estar aqui com a gente! Cara, a gente tá empolgado, né? A gente nunca tinha lançado — acho que ninguém, né — um disco tentando mensurar o alcance dele ou a resposta dele só no universo virtual. Tá sendo bem bacana acompanhar como as pessoas tão se relacionando tanto com o primeiro volume, quanto com o segundo.

JEAN: Sim, tão fazendo as contas aí, conseguindo juntar, entender a unidade, tá sendo muito doido.

TRACKLIST: As teorias, né?

LAY: Agora que começa o boom das teorias, né? (risos)

LIO: Ah, eu li uma hoje de manhã bem boa! (risos)

TRACKLIST: E por falar nisso, é muito curioso vocês terem dividido o álbum em duas partes. Como vocês decidiram repartir esse lançamento em dois volumes diferentes e quais as diferenças que vocês percebem entre eles?

LIO: Ontem à noite, antes de dormir, a gente entrou num papo bom falando sobre como a gente compreende o ato do lançamento como o movimento de assuntar. Você propõe pras pessoas um assunto e quem tá naquela roda às vezes responde, às vezes fica aquele silêncio constrangedor, ou o assunto não colou e ninguém quer falar daquilo. Eu sinto que a divisão dos volumes foi justamente a divisão dos assuntos, como é que a gente ia começar a conversar com as pessoas. A gente compreende que tem um movimento musical ou artístico em que o artista constrói uma obra pra si, e ela reverbera só nele, faz sentido pra ele, e às vezes a gente não entende nada, não consegue conversar, enfim. E nosso objetivo era justamente o contrário: produzir uma obra pra iniciar uma conversa. E eu sinto que a divisão do disco tem o objetivo de facilitar os assuntos…

LAY: Não são assuntos extremamente opostos, não é como se a gente tivesse feito coisas que não se complementam assim. Mas é legal quando a gente pode dar atenção pra uma coisa, e depois dar atenção pra outra coisa, sabe?

LIO: A gente também tinha sempre, não sei se o temor, mas o cuidado de familiarizar o nosso público, as pessoas que acompanham a Tuyo com as mudanças que a gente queria propor. Então quando a gente olha a nossa obra e pensa em “Pra Doer” e “Pra Curar”, no quão acústicas elas são, nos timbres que tão ali dentro, eu sinto que desde o lançamento do “Pra Curar” a gente tem procurado familiarizar as pessoas com novos timbres. Eu sinto que o “Chegamos Sozinhos em Casa, Vol. 1” também tem essa preocupação de apresentar pras pessoas uma outra paleta estética — não só do tema da lírica, mas também dos beats, né? A gente ficou um pouco mais upbeat, pesou mais a mão no eletrônico, mas eu sinto de retorno que o nosso público não estranhou porque eles vêm sendo familiarizados com isso há muito tempo.

Eu também sinto que o volume 1 e o volume 2 observam o mesmo objeto, que é a vida adulta, um recorte da vida adulta. Mas eu sinto que no primeiro volume a gente tá falando sobre identidade, sobre você se reconhecer nesse novo lugar de mais autonomia — a gente brinca que é a hora que o boleto não chega mais no nome dos seus pais nem de alguém da república, chega no seu nome, é o seu CPF que suja! (risos) E eu sinto que no volume 2 a gente tá falando não de uma identidade, mas de um ciclo que também acontece na vida adulta, que é isso da gente planejar uma coisa, ver essa coisa fracassar, se arrepender, planejar de novo… Acho que essas são as principais diferenças entre os dois volumes.

JEAN: Amei!

TRACKLIST: Aproveitando esse gancho sobre a sonoridade, esse é um disco que continua muito autêntico, como os antigos trabalhos, mas que traz mais influências, tem um estilo mais upbeat, que traz uma influência da música eletrônica, um som que mais pessoas conseguem se identificar, acho. O que mais influenciou vocês durante a gravação do disco?

JEAN: O prazo! (risos) A gente teve que organizar o tanto que a gente queria dizer, essas coisas que a Lio acabou de resumir, dentro do prazo de entrega e de produção, e também ao mesmo tempo que a gente tava fazendo o disco e escrevendo ele, a gente tava finalizando o circuito do “Pra Curar”, né? E isso influenciou muito sim na estética e em tudo isso, os beats e a produção musical no geral tinham um objetivo máximo de ser o mais simples possível — claro que com muito cuidado, sobretudo com o que a gente queria dizer e tocar, mas ela tinha que ser fácil de ser escutada, sabe? A gente também não queria gastar muito tempo no conceito da coisa e ficar fritando muito, sabe? A música tem que ficar pronta: “tá dizendo a mensagem que a gente tá querendo dizer?”, se tá dizendo, beleza, vamos pra próxima. Eu acho que isso, em algum lugar, pressiona a gente, a gente entra num modo diferente de compor… Entra um conflito, né? Naquela coisa de ser criativo com o tempo de produtividade que você tem, mas ainda assim é possível, né? E isso não matou o lado artístico da coisa toda num geral, acho que só colocou a gente numa outra dinâmica, em que o prazo era um dos pilares de construção.

LIO: Eu sinto também que quando a gente fala em prazo e em construção, e também nessa meta se a música tá falando o que a gente queria dizer, é porque o que pautou a gente não foi necessariamente uma escolha estética, porque a gente vai obedecendo nossas escolhas estéticas de acordo com o que a gente vai ouvindo. Enquanto a gente tava rodando com o “Pra Curar”, a gente tava descobrindo novos discos, entendendo como que o disco se materializa no palco, mas eu sinto que tanto o volume 1 quanto o volume 2 tão pautados na escolha de iniciar uma conversa. Talvez daí a sensação da música mais pop, porque até então a gente não tinha grandes preocupações com o refrão, e essa foi uma das preocupações desse disco. Ele tem um desenho maior de refrão, quase todas as músicas têm refrão, o que é raro pra gente. Então eu sinto que, se o que a gente queria com esse disco era conversar, acho que o primeiro movimento era se fazer entender, né? Então a gente não quis estabelecer a estética em cima de nada muito elitizado, nenhuma linguagem muito distante das pessoas. A gente olha pro nosso público e pensa: “a gente tem coisas pra dizer que são nossas coisas, como que a gente vai falar isso de maneira com que a gente consiga conversar com as pessoas?”. Aí eu sinto que talvez as escolhas estéticas venham daí.

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Foto: Divulgação


TRACKLIST: Vocês comentaram que esse disco foi escrito antes da pandemia, mas ele também conversa muito com o momento que a gente tá vivendo, tem muito sobre a intimidade e sobre dialogar com si mesmo. Gostaria de perguntar como que vocês enxergam o álbum dentro desse contexto?

LAY: Mais uma pauta, né? Chega a ser irônico porque a gente conversou bastante sobre isso. Aconteceu desse disco ser… Sei lá, a gente tá vivendo uma lupa assim, né? Dando atenção pra coisas que já existiam antes, já permeavam as nossas vidas cheio de trabalho e compromisso, cheio de coisas pra fazer fora da própria casa. Aí, eu sinto que a gente tava levantando essas questões, muito porque a gente fala do que a gente vive. 2019 foi um ano maluco pra nós onde várias mudanças aconteceram, vários movimentos singulares e ao mesmo tempo plurais começaram a rolar entre nós três, e aí ironicamente estamos vivendo essa parada que generalizou, globalizou.

LIO: Acho que a coincidência tá no fato de que em 2019, nós estávamos numa ânsia por estabelecer um território particular, que era essa da gente estar o tempo inteiro na estrada, e estar desesperado pra voltar pra casa, mas a gente não queria mais voltar pra casa do jeito que tava, porque a gente morava juntos e trabalhava juntos. Eu queria ir pra um apartamento meu, a Laiane pra um dela, o Jean pra um dele, e a gente começou a se perguntar o que isso significava, por isso o volume 1 fala bastante sobre território. O que acontece é que quando a gente entrou em 2020, todo mundo também tava discutindo território porque teve que voltar pra casa dos pais, porque teve que repensar com quem mora, onde vive, repensar os custos… O que era um movimento muito pontual e particular nosso, isso de entender que casa é essa, voltar pra casa, lembrar de onde saiu, virou um movimento global.

LAY: O que eu acredito também é que… Sei lá, se a gente soltasse esse disco em uma outra circunstância que não fosse pandêmica, obviamente, eu acredito que muitas pessoas se relacionariam também, porque o fato de ser uma parada singular que a gente tá vivendo não anula que outras pessoas do outro lado do mundo também estejam vivendo, só que não tava sendo tão dito dessa forma, né? Em todos os lugares o tema começou a ser discutido, não é como se ele nunca tivesse existido, sabe?

TRACKLIST: Pro “Chegamos Sozinhos em Casa”, vocês tinham mais recursos pra gravar o disco, mas também mais fãs, mais visibilidade e mais expectativas do que nos outros trabalhos. Como foi pra vocês, durante o último um ano e meio, gravar esse disco nessas circunstâncias?

LIO: O segredo é não pensar! Não pode pensar! (risos) 

JEAN: O prazo! (risos)

LIO: Eu lembro que a gente começou a pensar na expectativa do público depois que o disco já tava pronto, então não dava mais pra voltar. O “Pra Doer” e o “Pra Curar”, como eram trabalhos de estreia, ninguém sabia que existiam, qualquer coisa que a gente entregasse… A gente tava sem pressão. Eu sinto que essa coisa da maldição do segundo disco começou a ser discutida depois dele já gravado, isso explica minha úlcera na hora que a gente foi lançar o primeiro volume, eu tava bem noiada.

LAY: Se ninguém gostar, acabou o meu trabalho! (risos)

LIO: Eu tava pensando: “a gente fez um disco há quase um ano atrás, talvez ele não esteja mais dentro da tendência, talvez as pessoas estejam ouvindo outra coisa na época em que ele for lançado”. Acredito que a gente deu sorte de ter construído uma coisa que segue se comunicando desde 2019… Ele segue falando, talvez fale até mais, sei lá. Acho que o segredo é não fazer disso uma questão, né? Pensar que a mesma coisa que a gente fez no segundo disco foi o que a gente fez no primeiro: falar sobre as coisas que a gente queria.

LAY: Eu lembro também que muitas das nossas conversas antes de fazer esse disco era sobre o nosso anseio, o desejo, sei lá, egoico, de fazer e dizer coisas que fossem minimamente atemporais, sabe? São temas que não são pontuais, não são coisas que você vai ver ou viver uma vez só na sua vida, pelo contrário. Por eles se repetirem tanto assim nas nossas vidas é que a gente decidiu conversar sobre eles, entre nós e com as pessoas que ouvem, justamente porque esses ciclos morrem e nascem, morrem e nascem… Eu acho que isso é uma parada que ajudou bastante a gente também, de continuar conversando essas conversas com amigo que você começa sete da noite, quando vê, é duas horas da manhã e quando vê, você ainda tem coisas pra dizer que você decide esperar um outro reencontro pra continuar conversando porque são temas que quanto mais você cava, mais coisa vocês acham pra conversar.

TRACKLIST: Nesse meio tempo entre um álbum e outro, vocês colaboraram com vários artistas, e pra esse disco vocês trouxeram vários artistas de todas as áreas pro trabalho de vocês, desde o Lenine e a Drik Barbosa no segundo volume até o Luccas Carlos e o Lucas Silveira no primeiro. Como é unir vários desses mundos num só trabalho da Tuyo?

LAY: É estilo “A Grande Família”, né? Vai chegando.

JEAN: Ah, eu amo! Eu gosto de juntar tudo isso numa linha do tempo só. Eu acho que é a prova que a gente tá colaborando pra que seja possível o fim dessas regras de bolha e de gênero, sabe? Eu acho que essas colaborações musicais entre vários gêneros são um resultado de várias barreiras se quebrando na nossa vida. Se a gente consegue se permitir fazendo uma colaboração com uma galera do rap e depois com uma galera de MPB, isso comunica que a gente tá conseguindo transitar em vários meios e conseguir conversar com vários meios também, sabe? E não só pelo rolê de fazer música, mas de se interessar pelo outro também, interessar o que tá acontecendo ali num outro meio que eu ainda não convivo tanto… Não sei, eu acho que é um aprendizado, sabe? Porque o cuidado de fazer a música com a Drik, depois fazer com o Lenine, depois com o Lucas, a gente tem que se debruçar e conhecer aquela pessoa e ela também tem que conhecer um pouco da gente, e essa troca que faz a gente crescer. A cada vez que eu consigo colaborar com outros artistas que fazem uma caminhada muito parecida, mas em outro universo, eu me sinto maior, sabe? Eu me sinto expandindo. Eu sinto que todas as colaborações que a gente fez foram movimentos de expansão da Tuyo.

LIO: Eu lembro que quando a gente abordou o Rafa [Dias] pra colaborar em “Do Lado de Dentro”, a gente já tinha uma trajetória de acompanhar ele. Em 2019, a gente volta e meia cruzava com ÀTTØØXXÁ, aí eu lembro do Jean estar pensando em novas coisas, ouvindo novas músicas e desesperado pra conseguir se posicionar no palco atrás do Rafa pra saber como é que ele operava, que set é esse que ele usa, e muito do que ele operou no ÀTTØØXXÁ foi escola pra gente desenhar as coisas dentro do disco, dentro dos shows, e ter ele materializando essa fusão de linguagens dentro de uma faixa é muito bonito quando a gente pensa na nossa trajetória. E eu acho que a coisa das colaborações e dos gêneros tá caminhando pra uma tendência que eu acredito que seja uma tendência contemporânea ou pra um futuro próximo na qual a gente tem muita fé, que é a dissolução do gênero em si, qualquer que seja. Eu entendo que os limites de engavetamento das músicas — o que é sertanejo, o que é forró, o que é funk, o que é rap — são importantes pra gente conseguir compreender a constelação de linguagens que a gente tem, mas eu sinto que a fidelidade cega a esses gêneros atrasa os movimentos de troca.


TRACKLIST: Vocês já colaboraram com vários nomes, mas tem algum especial que vocês ainda sonham em gravar pra um trabalho da Tuyo?

LIO: Acabei de realizar o sonho do Lenine, não sei mais pra onde ir! (risos) Péricles!

LAY: Eu ia abrir a boca pra falar dele! E a Alcione!

TRACKLIST: Seria perfeito! Voltando ao “Chegamos Sozinhos em Casa”, acho que um dos principais destaques do trabalho é não só o som, mas essa maneira única e muito direta que vocês têm de compor, e nesse disco, acho que tem músicas como “Fracasso” e “Saudade Impura” que refletem isso. Qual o principal norte que vocês têm e o que mais inspira vocês pra escrever as músicas?

JEAN: O desespero do choro ali na hora de ter que escrever alguma coisa ali. Eu acho que quando a gente junta essas ideias, não é pensando na música. Acho que, no hábito de escrever, a gente acaba considerando o que vai virar uma canção, mas o principal motivo na hora de escrever ali é organizar o pensamento, organizar as ideias, então nessas horas não tem limite. O nosso principal guia somos nós mesmos. Cada pessoa que escreve é o sentimento ali do que tá vivido.

LIO: Veja se faz sentido pra vocês, porque a gente não conversou sobre isso ainda, mas eu sinto que a gente sempre se põe pra escrever quando a gente tem perguntas pra fazer, porque a sensação de conformidade não provoca a gente. A gente dificilmente escreve sobre alguma coisa bonita que a gente viveu, quando tá tudo bem, porque você não tem pergunta nenhuma pra fazer pro papel, já tá respondido.

LAY: Quando eu escrevo, por exemplo, eu tô no intuito de resolver coisas que provavelmente são irresolvíveis, ou pelo menos eu ainda não consegui encontrar como. Hoje, eu entendo mais que não é tanto na ânsia de resolver, mas é no anseio de identificar pelo menos. Tipo “tá, minha cabeça, meu coração, meu corpo, tão num caos agora, caos dentro, caos fora, como eu vou começar a organizar essas coisas?”. Aí eu vou lá e trá! Escrevo.

LIO: Então, sei lá, você tá num dilema de relacionamento em que você tinha um plano que você ia casar com aquela pessoa e ter 12 filhos. De repente, você vê esse plano interrompido. Não é no minuto seguinte que você se resolve, você pensa “bom, tudo bem, eu já sabia que nada dura pra sempre, paciência, vida que segue”. Você tem muitas perguntas até que a sua vida se reequilibre. Eu sinto que nesses momentos em que a gente é deparado com algum confronto, por exemplo, “eu achei que tava tudo bem entre mim e meus pais, a gente brigou, o que eu vou fazer com isso?”. As perguntas que eu tenho pra fazer ou as possibilidades que eu tenho de resolução vão pro papel. Acho que a nossa lírica, num geral, é pautada sempre nessas perguntas: “como é que eu resolvo coisas irresolvíveis?”.

LAY: O que às vezes é muito bom, funciona, e às vezes trava um pouco. Por exemplo, pra mim, eu vou ficando no papel e eu sei que tem outras coisas que eu tenho que resolver fora do papel, que é conversando de fato. (risos)

LIO: Mas eu acho que “Fracasso” e “Saudade Impura” tão muito dentro dessa movimentação lírica nossa. Sei lá, aconteceu alguma espécie de embate na vida pessoal de cada um, a gente tem soluções pra propor, ou até coisas que você não dá conta de falar pra pessoa porque você sabe que são suas, você sabe que é projeção, mas você pensa “será que eu vou lá no WhatsApp e xingo dela de tudo quanto é nome ou isso é coisa minha?”. “Vou escrever uma música!”. (risos)

TRACKLIST: Uma boa parte do disco tem músicas que foram feitas pra serem tocadas ao vivo. Como vocês estão aliviando essa saudade dos palcos e qual a expectativa de vocês pra voltar aos shows?

LAY: Eu tô matando minha saudade ensaiando! O que nos resta é se preparar pra esse grande momento, tô tentando trocar a frustração pela expectativa, o que pode ser frustrante! (risos) Mas eu acho que qualquer coisa que venha depois desse período tenebroso de quarentena e distanciamento, minimamente um olho no olho que a pessoa esteja a, sei lá, dez metros de distância, eu já vou ficar feliz! Eu sinto que hoje é essa preparação de ensaiar, pensar… O desejo, de quando a gente tava fazendo essas músicas, era poder colocar no palco, a gente pensou esse disco pra tocar mundo afora. Então agora eu sinto que tô nessa expectativa ensaiando, feliz com os ensaios, tô gostando muito de ensaiar. E óbvio, pensar nesses planos que são alternativos, que são as lives, onde a gente pode conversar com o pessoal de um jeito diferente, mas são os caminhos aí que foram apresentados pra nós por enquanto.

LIO: Eu sinto que esse disco foi sim construído pra ir direto pros palcos ou pra soar diferente da experiência do que foram os shows do disco anterior, e isso segue nos nossos planos. A gente não abre mão de fazer isso só quando estivermos seguros pra viver alguma experiência ao vivo, mas a rinha dos prefeitos tá ajudando! (risos)

LAY: Quero minha vacina! (risos)

TRACKLIST: Em março, vocês participaram do SXSW 2021, e vocês foram eleitos como uma das melhores apresentações do festival pelo The New York Times. Como foi pra vocês, vindo de tão longe, receber essa notícia lá fora?

LAY: A validação é uma coisa doida, né? (risos) Fiquei feliz, fiquei orgulhosa.

JEAN: Dá vontade de acabar a pandemia logo, deixa mais ansioso.

LIO: Acho que talvez o principal sentimento desse momento seja entender que tem alguns assuntos que ultrapassam a linguagem, né? Que ultrapassam a cultura. É bonito ver os assuntos que a gente propôs ultrapassarem essas demarcações territoriais. E pensar que — imagina, nessa apresentação do SXSW, a gente teve quantos ensaios, uns dois, três? Se a gente tá começando a ensaiar pros shows do disco agora, e vai voltar, sei lá, em abril do ano que vem? Nossa! (risos)

LAY: Poxa! Eu vou tocar de olho fechado! (risos)

LIO: Essa apresentação do SXSW foi captada toda num take só, sem montagem, sem a linguagem de videoclipe. Acho que talvez as pessoas estejam tão ansiosas quanto a gente pra viver as experiências mais próximas possíveis do ao vivo.

TRACKLIST: Pra finalizar a entrevista, eu gostaria de perguntar pra vocês qual reflexão vocês gostariam de deixar aos fãs com os dois volumes de “Chegamos Sozinhos em Casa”?

JEAN: Tem uma frase muito extrema, que é a que “você nasce sozinho e você morre sozinho”. Ela chega a ser muito forçada de triste, mas tem uma beleza nisso também porque tem uma hora que você entende que é você com você pra poder resolver suas coisas, e que você pode sim abrir a gaveta e olhar as coisas que você não gosta e jogar fora, conseguir refletir sobre esse momento que a gente é forçado a olhar pra dentro, e fazer ele ser agradável, sabe? Estar sozinho, nesse sentido… Tem como poder passar por isso de um jeito saudável pra gente mesmo de um jeito que a gente consiga não superar, mas aprender a conviver com o próprio demônio, sabe?

LIO: Eu sinto que essa ideia da solidão sempre teve um caráter muito pejorativo porque a gente imagina que isso vem de uma exclusão, né? Mas eu sinto que a proposta do “Chegamos Sozinhos em Casa” tem mais a ver com a autonomia e pautar seus relacionamentos a partir de uma lógica não mercantil. Eu me relaciono com você não porque eu sou insuficiente e eu preciso de você, mas porque você é legal; eu já tenho tudo que eu preciso, mas eu gosto de você de graça. Eu sinto que talvez a proposta do “Chegamos Sozinhos em Casa” seja muito reorganizar o que se pensa da solidão na vida adulta.

JEAN: Uau! Poesia!


Ouça “Chegamos Sozinhos em Casa, Vol. 2” na íntegra:

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