Em 8 de julho de 2013, Jay-Z entregava ao mundo “Magna Carta… Holy Grail”, contradizendo todas as expectativas de um público sedento por sequência de sucessos que marcam sua carreira. O 12º álbum do rapper veio com uma proposta diferente dos seus antecessores: um lançamento 100% digital e mais preocupado com solidez do que com hits.
Em parceria com a Samsung, alguns usuários tiveram a oportunidade de receber, em primeira mão, uma cópia do álbum e materiais exclusivos em seus dispositivos, uma estratégia que, sequencialmente, seria seguida por grandes nomes da música, como U2 (com a Apple), até BTS (com a própria Samsung). O álbum recebeu certificado duplo platina nos Estados Unidos, ouro no Reino Unido, e ficou, por semanas, na 1ª posição dos charts norte-americanos e da Europa.
Reunindo os maiores nomes do hip-hop, R&B e rap, as faixas são sequências bem pensadas, com bons acertos e inúmeras referências. A primeira delas começa logo com “Holy Grail”, um feat com Justin Timberlake feito em diferentes camadas, inclusive com uma homenagem à Kurt Cobain e a icônica “Smells Like Teen Spirit”, do Nirvana, febre nos anos 1990.
Logo é possível lembrar quando o rapper subiu no palco do festival europeu Glastonbury em 2008, ousou tocar “Wonderwall” (do Oasis) e emendar com “99 Problems” para responder às críticas de que ele não deveria estar num festival alternativo. Furando a bolha, Jay-Z sempre buscou atravessar públicos. E, pensando nisso, “Magna Carta” é bastante democrático.
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Conceitos, referências e experimentações de Jay-Z em “Carta Magna… Holy Grail”
Em geral, álbuns são estruturados como uma jornada ao ouvinte – com início, meio e fim. Esperamos que o clímax esteja pela metade, com os principais singles divididos estrategicamente de maneira a não cansar ou enjoar tão rapidamente. “Magna Carta”, no entanto, funcionou de maneira diferente.
“Tom Ford”, por exemplo, é o principal single do álbum e já dispara no início, pertinho de “Holy Grail”, em uma descarga de adrenalina seguida por “F*ckwithmeyouknowigotit”, que reduz essa velocidade. É uma harmonia parecida com “Yeezus”, de Kanye West, lançado no mesmo ano, onde percebemos as influências de um artista sobre outro.
Diferente do “Black Album” ou da trilogia “The Blueprint” (dentre os fãs, as obras mais marcantes), “Magna Carta” não é um álbum que cresce exponencialmente, mas, se sustentou e maturou muito bem com o tempo. Hoje, ele pode ser visto como uma raridade – entregou tudo de maneira excelente: divulgação, parcerias, letras, singles e originalidade.
É fato que o gasto de energia foi todo na produção. Num mesmo álbum, estão, além de Timberlake, os nomes mais conhecidos da indústria: Beyoncé, Rick Ross, Travis Scott, Timbaland, Frank Ocean e Pharrell Williams. Esses nomes são marcados por diferentes estilos e composições, mas, em conjunto, registraram uma marca única que só “Magna Carta” foi capaz de imprimir. Em que outro lugar, hoje, encontramos algo parecido?
Ao juntar o mundo real e o divino, Jay-Z nos levou em uma viagem entre deuses numa experiência muito sensitiva e humana. São utilizados diversos elementos extras que nos deixam mais à vontade, como sequências que lembram “Bad Girls” (de M.I.A) e clássicos como “Losing My Religion” (da banda R.E.M).
O uso desses elementos criou uma atmosfera de familiaridade, interpolados de forma criativa em demonstrações líricas que não permitem, anos após seu lançamento, que o álbum seja visto como ultrapassado, preso em uma tendência da época. Foi um ponto de virada no segmento, e, quase uma década depois, criou uma referência para outros. Ao aproveitar de referências importantes no mundo da música, e priorizar essa qualidade na construção, “Magna Carta” é uma ode atemporal e que continuará marcando quem o quiser ouvir – tal qual um conto mitológico.