Enquanto os telespectadores de “Euphoria” (HBO) assistiam à série, também aguardavam ansiosos o lançamento da trilha sonora oficial, assinada por Labrinth, que escreveu, produziu e interpretou todas as faixas.
O que não se sabia, então, é que a trilha sonora, além de essencial para ditar o tom da série, destacaria-se no cenário musical, viraria a maior referência ao seriado e poderia ser apreciada por si só, mesmo por quem nunca viu o show.
A série
“Euphoria” (HBO) é uma série adolescente que narra os conflitos de Rue, a protagonista, e de seus amigos, colegas e conhecidos. A série destacou-se logo no início por contar com o cantor Drake como produtor executivo e por ter grandes nomes em seu elenco, como Zendaya, Sydney Sweeney e Jacob Elordi.
De seu lançamento até o último episódio, “Euphoria” ganhou diversos fãs, que se impressionaram com os temas abordados pela trama (como sexualidade, transexualidade, pornografia, prostituição, uso de drogas, estupro), com a fotografia, com as atuações que renderam prêmios e com a trilha sonora. Esta também não ficou de fora na lista de premiações.
A série, que teve sua segunda temporada adiada por causa da covid-19, voltará com dois episódios especiais em dezembro, enquanto as gravações não podem voltar ao normal.
A trilha sonora
“Euphoria” já chama a atenção se não olharmos para a trilha sonora original. A série toca, em suas cenas, artistas como Beyoncé, Lizzo, Billie Eilish, Rosalía e BTS. Há, também, espaço para artistas mais antigos: Bobby Womack, Andy Williams e Jim Reeves.
Tais músicas aparecem em festas, nos celulares dos personagens, nos carros; enfim, no dia a dia.
Já a trilha sonora original, produzida por Labrinth, é que dita o tom da série e é a responsável por conduzir longas cenas apenas com instrumentais ou definir uma música tema de um personagem, a qual pode ser reconhecida instantaneamente.
A trilha sonora para os momentos perfeitos
Comecemos do macro. Ao compor a trilha sonora da série, Labrinth não resumiu as faixas a temas para personagens ou a uma trilha sonora estável, que combinasse com a melancolia geral do show.
O álbum tem sua música mais famosa, “Still Don’t Know My Name”, mas é composto de diversas outras que compõem o clima de cada episódio. Isso está claro até nos títulos das faixas: “New Girl”, “Home From Rehab“, “Kat’s Denial”, “Euphoria Funfair” (uma faixa de dez minutos que transmite toda as emoções do episódio em que aparece, no qual os personagens estão em um parque de diversão) e “Arriving At The Formal”, para citar algumas.
Em suas 26 faixas, com 1h03 de duração, Labrinth traça os momentos mais importantes e impactantes da série no seu disco. É impossível, para quem viu “Euphoria”, ouvir a trilha sonora sem se lembrar de cenas exatas e arrepiar-se novamente.
O instrumental é preciso, com metais, sintetizadores e voz afinados e combinados para transmitir o que é mostrado em cena: Labrinth nos ajuda com maestria a mergulharmos no ambiente de “Euphoria“. Seus graves transmitem tensão, as suas cordas angelicais passam a sensação de leveza momentânea e sua voz, quando aparece, nos arrepia por inteiro.
As músicas tema de personagens
O maestro que nos conduz pela trama da série também está presente nos personagens principais. “Euphoria” tem, a cada episódio, seu foco voltado para um personagem: Rue, a principal, conta ao telespectador a história daquele que será o alvo do capítulo e, para isso, Labrinth está ao seu lado.
Nesses momentos, somos agraciados com músicas que serão como temas dos personagens e que, ao ouvir ao álbum, mesmo sem ler o nome das faixas, nos lembrarão deles.
A mais conhecida é “Still Don’t Know My Name“, que também é imediatamente relacionada à série quando escutada, mas também existem outras como “Shy Guy”, “Maddy’s Story”, “When I R.I.P.” e “Nate Growing Up“.
Euphoria e sua trilha sonora original: o corte do cordão umbilical
O que fazemos com uma trilha sonora?
Geralmente, nós escutamos trilhas sonoras que contam com músicas de artistas diversos que foram agrupadas para o produto audiovisual, como as famosas trilhas dos filmes de Quentin Tarantino, ou de musicais, que têm músicas feitas para funcionarem fora das telas, como “La La Land” ou “Grease: Nos Tempos da Brilhantina“.
É difícil encontrar quem aprecie e escute, no seu dia a dia, trilhas sonoras originais em grande parte compostas por instrumentais.
Para servir de exemplo, é só olhar os vencedores do Oscar de Melhor Trilha Sonora dos últimos anos: “Coringa“, “Pantera Negra“, “A Forma da Água“, “La La Land”, “Os Oito Odiados“, “O Grande Hotel Budapeste”. Uma pequena pesquisa até 2015.
Destes, os que tiveram grande destaque além das telas foram, justamente, os que envolviam ou músicas que funcionassem sem ser em conjunto aos filmes ou músicas que foram feitas para musicais.
O sucesso nas rádios, nas plataformas de streaming e na internet não é um indicador de qualidade, mas um indicador de como as trilhas sonoras funcionam sozinhas. Nesse caso, a de “Euphoria” vai contra o esperado: apesar de ser longa, conter várias faixas compridas (algumas com cinco, dez minutos) e ser baseada, principalmente, em músicas instrumentais, o álbum é um sucesso incontestável.
Por que o disco funcionou para além da TV?
Para responder a essa pergunta, são vários os fatores a serem analisados além da qualidade musical do trabalho de Labrinth.
A voz e a composição de Labrinth
Primeiramente, as faixas que contam com letras são poderosas: “Still Don’t Know My Name” e “When I R.I.P.”, principalmente, conquistaram os fãs que, por sua vez, fizeram o trabalho de divulgação juntamente à gravadora e ao próprio Labrinth. São faixas com letras fortes, com as quais o ouvinte pode se identificar, e que são muito bem interpretadas pelo artistas.
TikTok: um criador de virais
“Still Don’t Know My Name“, inclusive, foi alvo de discussão nas redes. Com uma busca rápida no Twitter, é possível achar fãs chateados por a faixa ter viralizado, virado desafio no TikTok e por as pessoas deduzirem do que se trata a série apenas pela letra da música.
O elemento surpresa: Zendaya e All For Us
É impossível negar, também, que uma faixa que não faz parte do álbum ajudou a angariar ouvintes para este. “All For Us“, lançada separadamente por Labrinth, foi incluída na trilha sonora da série. Mas este não foi o truque de mestre: no último episódio, os fãs foram agraciados por uma performance musical de Rue, personagem principal de Euphoria, cantando a música juntamente aos vocais de Labrinth em um suposto delírio causado por drogas.
Zendaya, que interpreta Rue, já teve parte de sua carreira voltada para a música e sua voz é, sem dúvidas, espetacular. Isso, combinado à composição e aos vocais de Labrinth e à cena que encerra o último episódio, elevou a trilha sonora de Euphoria a outro patamar em termos de sucesso de público.
Sem dúvidas, muitos dos fãs da série que não tinham interesse em ouvir a trilha original correram para escutar All For Us com a participação de Zendaya, além dos fãs da atriz que, por algum motivo, não acompanhavam a série. Assim, uma vez na página de Labrinth, é fácil dar play no álbum composto para a série, ver se é de seu gosto e provavelmente se encantar pelas músicas.
Por último, mas não menos importante: a divulgação de Labrinth
Labrinth é esforçado em seus trabalhos, isso é inegável. Desde seus projetos solo até o álbum que lançou em conjunto Sia e Diplo, o artista sempre entregou projetos bem acabados, músicas inovadoras e clipes impecáveis. O mesmo esforço foi visto em seu trabalho com Euphoria.
Os clipes oficiais de Labrinth para série são das faixas All For Us e Still Don’t Know My Name, o primeiro sendo a performance de Zendaya como Rue, na série, e o segundo composto por cenas de uma apresentação de Labrinth e recortes de cenas de Euphoria.
Essa apresentação foi feita no dia 24 de agosto e nela são cantadas as faixas “Forever”, “Still Don’t Know My Name“, “When I R.I.P.” e “All For Us“. Em um ambiente com luzes neon rosas, roxas e azuis, Labrinth canta as músicas sozinho em um palco. Deita-se no chão, move seu corpo por todo o espaço disponível e demonstra diversas emoções enquanto apresenta-se.
Para além das grandes produções, Labrinth também divulgou, em seu Instagram, bastidores da composição do álbum e agradecimentos aos envolvidos no projeto.
Enfim, quais os resultados?
Em outubro de 2019, o álbum alcançou a vigésima posição no iTunes e 173ª no top 200 de álbuns da Billboard, passando três semanas no ranking.
Still Don’t Know My Name, talvez considerada a música tema da série, estreou na décima quinta posição. No mesmo chart, All For Us debutou na vigésima primeira posição.
Já no Spotify do cantor, na aba “Popular”, três da cinco músicas são as que compõem a trilha sonora de Euphoria. No total, o álbum reúne 312,636,600 milhões de reproduções, sem contar, claro, All For Us, que não está inclusa no disco mas que foi ouvida mais de 88 milhões de vezes.
Para além dos números, fica, para o público, uma trilha sonora que pode ser apreciada por quem assistiu ou não a série, por quem é e por quem não é fã.
No disco, Labrinth foi capaz de compor uma trilha perfeita para uma narrativa, de forma que sua obra musical é passível de ser separada da inspiração original sem perder coesão e sentido.
O álbum, com ou sem a série, pode ser ouvido, cultuado e entendido: um feito para poucos que se arriscam nessa área.