Há quase dez anos, as músicas do Twenty One Pilots existem em um universo próprio de histórias, personagens e teorias. Cada lançamento se torna um grande evento entre os fãs, não somente pela chegada de novas músicas, mas pelas diferentes maneiras que a banda encontra de conectar suas obras e movimentar o seu público. Foi assim que “Clancy”, álbum de estúdio do duo lançado nessa sexta-feira (24), foi apresentado ao mundo como o capítulo final de uma narrativa de uma década.
Em muitos sentidos, o novo disco soa como uma despedida. Muito além de histórias paralelas para as músicas e videoclipes, o trabalho parece apontar para o início de um novo momento pessoal e profissional para Tyler Joseph e Josh Dun no auge de suas carreiras: a dupla não somente se consolidou como uma das maiores bandas da nova geração em meio a turnês internacionais, como também parece se encontrar em seu momento mais satisfatório.
Talvez por isso que “Clancy” soe exatamente como uma grande celebração da trajetória que o Twenty One Pilots percorreu até aqui. O disco revisita cada uma das fases da banda em um encontro de estilos musicais que, ao mesmo tempo que enaltecem as influências que os consagraram, parecem limitar a dupla a explorarem novas inspirações e se abrirem ao diferente.
O fim de uma saga do Twenty One Pilots
Para aqueles que acompanham o Twenty One Pilots menos avidamente, explicar a narrativa conceitual que a banda construiu ao longo dos últimos discos pode ser uma tarefa desafiadora, mas a dupla faz um excelente trabalho em envolver os fãs dentro dela. O disco foi anunciado nas redes sociais em fevereiro com um vídeo amarrando os pontos entre os últimos quatro projetos da banda de maneira criativa e autêntica, explicando a jornada de um personagem chamado Clancy em sua fuga da cidade distópica de Dema.
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O esforço da banda em dar vida às suas histórias é tamanho que 12 das 13 faixas receberam clipes que ajudam a ilustrar a narrativa da obra. O lançamento do disco chegou a ser adiado em uma semana para que todos os vídeos estivessem prontos para serem lançado juntos na mesma data em que o álbum, o que reforça o cuidado de Tyler e Josh com o próprio produto.
É sempre muito louvável, inclusive, acompanhar as diferentes maneiras que artistas encontram de engajar seu público e transformar os seus trabalhos em uma experiência única. Entretanto, grande parte das músicas não acompanham a mesma profundidade e perfeccionismo, e soam muito menos grandiosas sem os planos de fundo que a dupla procura adotar.
Um sentimento pertinente ao longo de toda a audição é o de que a sonoridade pouco mudou em comparação a outros álbuns. Na verdade, “Clancy” soa como uma grande síntese dos últimos discos da banda, mesclando o pop rock solar de “Scaled And Icy” (2021) com o rock alternativo que consagrou “Trench” (2018) e “Blurryface” (2015). Apesar desses encontros renderem bons momentos ao trabalho, a impressão é que a obra se restringe ao estilo que já conhecemos do Twenty One Pilots ao invés de explorar novas direções.
“Overcompensate”, faixa de abertura do disco, é um ótimo exemplo de retorno às origens e um enérgico início para o projeto, embora sua euforia não chegue a atingir um ápice. Em seguida, “Next Semester” e “Midwest Indigo” incorporam um pop punk que remete aos melhores momentos de “Vessel” (2013), mantendo o ritmo em alta para as próximas canções e mostrando novos lados de uma mesma sonoridade.
São poucos os momentos em que o duo se permite aventurar pelo inédito e romper, mesmo que pouco, a barreira do que comumente esperamos do Twenty One Pilots, mas eles definitivamente estão entre os melhores do álbum. “Vignette”, um dos grandes destaques da tracklist, enfatiza os falsetes de Tyler no refrão em uma faixa que deve tomar os coros das grandes arenas; já “Navigating” mistura sintetizadores com as potentes linhas de baixo e a bateria de Josh para dar vida a uma das canções de maior potencial de sucesso do álbum.
As composições fazem muitas alusões à história de Clancy, ainda que soem mais como um complemento aos videoclipes do que como uma narrativa própria. Contudo, Tyler também encontra alguns momentos de introspecção para escrever sobre as próprias experiências, como em “Snap Back”, na qual reflete sobre o medo de ter um relapso em sua saúde mental, e em “The Craving (Jenna’s Version)”, uma letra tocante dedicada à sua esposa.
Em um ritmo gradativamente épico, “Paladin Strait” encerra o álbum retratando um duelo entre Clancy e Nico, um dos arquirrivais que estrelam a narrativa contada pela banda. A composição e a música não deixam claro o fim da história, deixando-o aberto à imaginação dos ouvintes mais atentos ao enredo.
Um encontro de influências e estilos
Dentro do caldeirão de influências e estilos que “Clancy” propõe, o disco encontra dificuldades de encontrar a sua própria identidade no seu decorrer. Em muitos momentos, o trabalho parece se distinguir muito pouco de seus antecessores mais antigos, mas em uma versão menos inspirada, ainda que mais amadurecida.
O Twenty One Pilots que o mundo conheceu em 2015, com sucessos mundiais como “Stressed Out” e “Ride”, conquistou uma multidão de fãs não apenas pelo talento, mas pela juventude eufórica de suas canções, com ritmos mais acelerados e composições mais urgentes. De muitas maneiras, “Clancy” nos apresenta a versões mais maduras de Tyler e Josh como artistas e pessoas; as letras direcionam para reflexões mais conscientes, mas a música parece ter perdido um pouco de seu gás criativo.
A essência da dupla, entretanto, segue inflamada entre os fãs e nos momentos mais grandiosos do álbum, que certamente devem marcar as próximas apresentações do duo. Como uma despedida natural de uma história que vem sendo contada há quase uma década, “Clancy” comemora alguns dos melhores momentos na discografia do Twenty One Pilots, mas também reforça a necessidade de se virar a página.