Estreia nesta sexta-feira, 17 de novembro, a nova série brasileira original Amazon, “Amar é Para os Fortes”. Produzida pela Pródigo Filmes e dirigida por Kátia Lund, Yasmin Thayná e Daniel Lieff, o seriado foi desenvolvido por Antonia Pellegrino, Camila Agustini e Marcelo D2. Saiba mais sobre a produção a seguir!
(Atenção! Esta matéria pode conter spoilers)
Conheça “Amar é Para os Fortes”, nova série do Prime Video
A história de “Amar é Para os Fortes” acompanha a saga de duas mulheres negras cariocas que veem seus destinos entrelaçados para sempre durante uma operação policial no Dia das Mães. Rita (Tatiana Tiburcio) perde seu filho de 11 anos, Sushi (João Tiburcio), para a violência policial, e Edna (Mariana Nunes) é mãe de Digão (Maicon Rodrigues), o policial que matou a criança.
Buscando justiça e redenção, ambas irão enfrentar a corrupção policial e a morosidade do sistema judiciário. Rita terá o apoio de seu filho mais velho, o artista plástico Sinistro (Breno Ferreira) que, junto com a comunidade da Maré, lutará por justiça para Sushi. “Para mim foi bem intenso se preparar para viver essa mãe preta que carrega tantos atravessamentos e gatilhos que a gente tem na vida individualmente”, comenta Tatiana Tiburcio ao Tracklist, sobre como foi se preparar para viver sua personagem.
A atriz explica como foi uma experiência única ter atuado ao lado do seu filho na vida real, João Tiburcio. “Colocou em prova muito do que eu tinha aprendido, que eu desenvolvo, enquanto técnica de interpretação. Foi uma prova de fogo nesse sentido, na construção de Rita, que é essa mulher aguerrida, batalhadora, amorosa, generosa, mãe, amiga”, complementa.
Para Breno Ferreira, que vive Sinistro, filho de Rita, seu personagem foi como um presente para o ator, porém a gravação não foi fácil. “A preparação me trouxe um amor novo, que foi o grafitti. Foi maravilhoso. O processo foi doloroso, porque o que estamos contando não é fácil. É um personagem que eu tenho um apreço enorme. A gente como ator e atriz ficamos felizes quando pegamos [um trabalho] não só pela quantidade de cenas, mas pela densidade delas. A gente fica feliz porque é um desafio, mas também muito impactado e duvidoso”, adianta.
Por outro lado, Mariana Nunes conta como foi o processo de preparação desde a sala de ensaio, onde a artista teve dimensão de como era essa família que estava sendo construída. “Eu, meu esposo e meu filho: Edna, Digão e Rodrigo. Não faz falta ver na série, mas conseguimos enxergar nela o resultado dessa linha que criamos antes. A construção, no meu caso, foram muitas informações levantadas durante a preparação e que, como elas não apareciam, estavam pulsantes dentro de mim. Acho que isso ajudou muito a compor quem é a Edna, essa mulher que está sempre pensando, arquitetando, querendo que dê certo para o lado dela”, falou.
“Chegou como uma missão contar essa história”, observa Maicon Rodrigues, que interpreta Digão, o policial filho de Edna. “A primeiro instante, [Digão] parece ser uma pessoa correta, dentro do que ele se propõe a estar fazendo, e aí acontece o crime. A partir disso, todas essas ideias que teríamos sobre ele vão caindo por terra. Eu queria muito contar isso com muita responsabilidade e honestidade mas, ao mesmo tempo, lidando com as minhas próprias contradições em relação a se compadecer em algum lugar com esse personagem, porque acontecia isso comigo, de defendê-lo e não defendê-lo em alguns momentos. Foi muito complexo”, revela o ator.
O que esperar do primeiro episódio
No início de “Amar é Para os Fortes”, assistimos ao crime que levou a vida de Sushi. “Já no primeiro episódio é isso. Começa de um jeito que a gente já viu muitas vezes por aí. Um menino assassinado. Mas aí a gente vê também o drama do policial, que é esse jovem, também negro, filho de um policial, e que não queria estar ali. Que estava pilhado pelo colega do lado [que é branco, uma patente acima]. E a mãe desse policial em casa, esperando por ele para o almoço de Dia das Mães, imaginando o que será que aconteceu. A partir disso me deu muita curiosidade de saber até onde ia isso. E fiquei feliz com o que li”, conta Nunes, adiantando sobre o desfecho do seriado.
Apesar de ser uma produção que traz mais uma vez esse tipo de história, Ferreira aponta o que há de diferente em “Amar é Para os Fortes”. “Quando acabei o primeiro episódio, fiquei: ‘Nossa, mais uma vez essa história. O que será que tem de diferente nisso aqui?’. São os dois pontos de vista contados em uma mesma história, que são de duas famílias pretas e protagonistas. É diferente por isso, porque tem a resolução dos dois lados, sabe?”, justifica.
“Acho que o que mais instiga a gente dentro dessa história é isso. No primeiro episódio, já acontece tudo com o Digão ali, muito rápido. A partir daquilo a trama vai para um lugar, sai dessa tragédia, e não fica só nisso do tiro, favela, polícia e aquelas coisas. A gente começa a ir para um lugar de entender o que são essas famílias vivenciando esses processos de perdas, dores, choro, mágoa. A gente começa a ver essas duas mães pretas tendo seus destinos entrelaçados. Acho que a riqueza do roteiro vem desse lugar”, complementa Rodrigues.
Além disso, na visão de Tiburcio, a série conta com códigos “nem tão sutis assim, que foram só aumentando no decorrer dos roteiros, em cima dessa história que a gente já viu tantas vezes”. “Ele foi pilhado por um homem branco. Se você pensar metaforicamente, é esse Estado, que é branco, que está pressionando esse sujeito que é preto – em sua maioria, esses policiais são negros – a matarem os seus. A gente está trazendo para uma obra de ficção e entretenimento um discurso muito profundo”, pondera a artista.
“Para nós, pretos e pretas, que estamos mergulhados nesse debate, a gente percebe um pouco mais rápido esses códigos de desconstrução do imaginário. Porém, mesmo aquele que não tem esse discurso tão latente no seu dia a dia, vai se dando conta disso mesmo que através da subjetividade. Isso para nós é fundamental. Isso que me chamou muito a atenção nesse roteiro a ponto de eu arriscar fazer o que eu fiz: colocar a minha maternidade em função dessa história, porque era algo que valia a pena o risco”, conclui Tatiana.
Criação e produção de “Amar é Para os Fortes”
Inspirada no álbum visual de Marcelo D2 de mesmo nome, o cantor fala ao Tracklist como foi o interesse da Amazon pela linguagem do seu trabalho. “A minha vontade, desde quando comecei a pensar em fazer audiovisual, era de construir filmes como eu faço discos: com muitas camadas e linguagem diferentes”, começa.
“É um assunto que, para mim, é muito importante. Eu venho falando disso acho que a minha vida inteira, isso foi base da minha obra quase toda. É um assunto muito relevante, que ao mesmo tempo a gente precisava desvendar isso. Aprendemos muito nesses últimos anos sobre esse assunto, falar dessa violência que a gente vive em uma cidade como no Rio de Janeiro. A possibilidade de tocar essa história através do olhar das mães. Ela tinha um imediatismo que era desafiador”, comenta D2.
“É uma adaptação que mergulha no video-álbum, no álbum, na trajetória do Marcelo D2, no repertório dele. É uma adaptação mais complexa do que literal”, complementa Antonia Pellegrino, co-criadora da série. “Tem uma coisa do artista Marcelo D2 que ele, de fato, consegue navegar música com estética, até figurino, jeito de contar a história, colagens fotográficas, pacote gráfico… Para mim, isso é muito papel de showrunner, e é uma coisa que ele nunca fez antes, mas achei que fez brilhantemente e está impresso na série”, concorda Malu Miranda, head de Originais do Amazon Studios no Brasil.
Além do foco nas mães, há o coletivo Crew, formado por Sinistro e seus amigos, que ajudam a buscar justiça por Sushi. “Para mim, esses personagens da Crew me tocam muito, porque eu fui um menino daquele, um artista que saiu dali, mas acho que envolve muito mais do que isso”, diz o cantor.
Trazer sobre a Crew, esse grupo de jovens que vão pedir justiça pela linguagem deles que é a arte, enquanto as mães vão pelo modo mais tradicional (principalmente Rita, que vai na defensoria e se une a outras mulheres em busca de justiça), era uma das preocupações da série, conforme relata a produtora Yasmin Thayná. “Temos vários olhares e perspectivas de justiça. Acho que o principal era retratar isso, essa busca por justiça muito ancorada na realidade. Isso não é uma mera obra de ficção. Embora seja, ela é um pouco um retrato do nosso país”, explica.
Marcelo D2 relembra o exemplo da atriz Clara Moneke, que vive Peixe, parte da Crew. “A história da Clara na série é incrível, sabe? Quando pedimos um segundo teste, ela mandou uma mensagem falando: ‘Marcelo, obrigada pelo convite, mas eu não tenho tempo para ser artista. Minha mãe está desempregada e eu preciso trabalhar’. Aquilo me tocou profundamente! Aquilo foi incrível, falei: ‘Tem que ser essa menina!’. Eu liguei pessoalmente para ela: ‘Clara, eu te entendo, eu já passei por isso, é uma oportunidade que você vai ter’. E está aí ela agora, estourada, uma grande artista, todo mundo conhece, fazendo novelas”.
Para Kátia Lund, um dos maiores desafios na produção do seriado era como conseguir manter a delicadeza, a atuação no tom e correr na velocidade necessária para filmar cinco minutos de uma cena ou outra. “Outro desafio era que a Amazon estava preocupada, porque é uma série muito densa, e ela quer alcançar um público grande. Era como conseguir ter tudo: a linguagem, o tom certo dos atores, tratar com seriedade o assunto, ao mesmo tempo entreter, ter ritmo, não passar por cima das emoções das pessoas. Isso foi um desafio que fomos lidando no decorrer das filmagens, procurando artistas locais, fotografia local, música… Testando coisas nas montagens para chegar nesse resultado que queríamos equilibrar”, justifica a diretora.
A roteirista Camila Agustini complementa: “É importante a gente dizer sobre a enorme responsabilidade que sentimos para contar essa história […], de chamar a atenção, trazer uma sensibilização de uma forma ampla na sociedade sobre um problema que temos que enfrentar. Tem uma questão que não podemos mais ficar insensíveis ou deixar passar calados um cotidiano que, de fato, dizima e causa muita morte, muita dor. Isso é uma tragédia em curso que temos que pensar sobre ela e enfrentar, pensar em uma solução para esse problema”, relata.
“Para além de toda a alegria que foi esse trabalho, tem uma responsabilidade muito grande de se valer do audiovisual que pode chegar na casa de milhões de pessoas, não só no Brasil como no mundo, para trazer uma reflexão muito importante sobre o que o país está vivendo. É um chamado de urgência, e também tem uma mensagem de esperança, porque escolhemos contar essa história do ponto de vista que acredita no amor, na união coletiva, na solidariedade, na resistência e que acredita na justiça”, finaliza Agustini.