O cantor e compositor australiano Vance Joy lançou, no fim de maio, Missing Piece, single que marca seu retorno à cena musical após um hiato de três anos. A música foi escrita virtualmente em parceria com Joel Little, compositor que já trabalhou com artistas como Taylor Swift e Lorde, durante o lockdown. Em versos como: “Eu te vejo, querida, mas você está pixelizada / É difícil de aguentar esses dias”, Vance canta sobre os relacionamentos que sobreviveram ao distanciamento social em meio à pandemia.
Entrevista com Vance Joy sobre Missing Piece
Para celebrar o lançamento de Missing Piece, o Tracklist conversou com Vance Joy sobre o novo single, pandemia e Brasil. Confira a entrevista na íntegra:
Primeiramente, parabéns pelo lançamento de Missing Piece! É uma ótima música, eu amei.
Muito obrigado! Eu agradeço muito.
Em 2021, você lançou You, parceria com Benny Blanco e Marshmello, mas Missing Piece é seu primeiro single solo em três anos. Como tem sido a experiência de lançar uma música depois de todo esse tempo e, ainda por cima, durante uma pandemia?
Tem sido ótimo! Tem sido encantador lançar uma música e ter coisas boas sendo ditas sobre ela. Eu tenho estado um pouco ocupado, mas eu tenho tido muito tempo para escrever músicas e também para fazer outras coisas, como muitos de nós tivemos no ano passado, tipo passar tempo com a família ou fazer qualquer coisa em casa, porque estávamos em lockdown por grande parte do tempo. Mas lançar uma música é muito emocionante e eu tenho recebido mensagens muito legais de amigos e família, lindas mensagens de fãs. A melhor coisa é quando você faz algo que você não tem tanta certeza, você não sabe como as pessoas irão reagir e aí você recebe algo legal em troca e é lindo. Apenas o fato de receber bons feedbacks já faz você se sentir bem e te mantém motivado a fazer mais músicas.
A música foi escrita virtualmente com Joel Little durante o lockdown, certo? Como foi a experiência de escrever via Zoom? Foi muito diferente de escrever cara a cara?
Boa pergunta. Foi um pouco diferente, porque tem um delay, então não dá para tocar junto ao mesmo tempo, mas, honestamente, eu não acho que isso é um grande problema. Eu nunca estive numa sala compondo enquanto alguém está tocando, e aí nós dois cantamos ao mesmo tempo e falamos “Perfeito, conseguimos!”. Não é assim, eu sinto que, geralmente, eu digo algo, aí você diz algo, eu respondo, então não importou muito que havia um delay. Além disso, Joel tinha uma ótima ideia na guitarra para começarmos e depois nós conversamos sobre o tipo de coisa que nós queríamos cantar. Aí o tema surgiu muito facilmente e a canção nasceu. Foi divertido e eu realmente gosto que dessa possibilidade [de compor à distância]. Eu tenho que dizer que é mais cansativo, você provavelmente sabe que ficar no Zoom por um grande período de tempo talvez canse sua vista e tudo mais, mas é tão mais eficiente, sabe? Não que compor tenha que ser eficiente, essa é a última coisa que uma composição precisa ser, mas é bom, porque eu não tenho que viajar para o outro lado do país ou para um local diferente para estar numa sala com ele e gastar um tempão chegando lá, mas também é legal ter momentos como almoços juntos, é legal se conectar com a outra pessoa. Existem prós e contras, basicamente. Existem coisas boas e ruins, mas se essa é a forma que tem que ser agora, tudo bem, e eu espero que isso continue, porque eu gosto da ideia de não ter que mudar meu estilo de vida para poder continuar escrevendo e colaborando com outras pessoas.
É mais simples, né?
É mais simples. E é legal usar a tecnologia como forma de tornar nossas vidas mais fáceis, ao contrário de nos fazer mais cansados, sabe o que eu quero dizer? Você não precisa ter um bilhão de e-mails e um bilhão de mensagens, mas, por algum motivo, nós temos. Eu pensei que os computadores serviam para tornar nossas vidas mais simples, mas, às vezes, eles complicam as coisas e nos deixam cansados.
É uma linha tênue.
É uma linha tênue. É isso. Exatamente.
O videoclipe de Missing Piece tem um enredo muito simples, e ainda sim lindo. Como foi a gravação do vídeo e como você contribuiu criativamente para o processo?
Obrigado! Essa é uma boa pergunta. Eu concordo. Eu acho que é um enredo muito doce, completo, bonito e muito simples. Eu amei a ideia da história do sanduíche. Minha amiga Annelise mora perto de mim em Melbourne e ela falou algo do tipo ‘Eu acho que nós devíamos fazer algo leve e engraçado. Você esqueceu seu sanduíche e ela corre pela cidade toda para te dar o sanduíche’ e eu achei ótimo. Eu amei tanto essa ideia que eu falei ‘É isso. Perfeito. Eu amei. Me parece muito cativante’. E aí, mais tarde, nós descobrimos que seria mais difícil do que nós esperávamos e que, talvez, nós teríamos que cancelar a ideia do sanduíche, porque, basicamente, nós não conseguiríamos gravar algumas partes. Então, minha contribuição para o videoclipe foi, quando a ideia do sanduíche foi meio que descartada, eu falei que se não tivesse a ideia do sanduíche, eu não achava que nós teríamos um bom vídeo. Eu acho que nós realmente precisávamos do sanduíche e estou feliz que nós fizemos o sanduíche.
E ficou ótimo!
Ficou ótimo e foram três dias tão divertidos. Nós passamos três dias filmando e foi ótimo me apresentar com meus amigos e os outros atores, que eram fantásticos. É tipo estar numa daquelas divertidas excursões do colégio, especialmente quando você é o artista, porque não tem pressão nenhuma sobre você. Você realmente só tem que aparecer no local enquanto as outras pessoas estão se estressando sobre ruas fechadas, permissões e como faremos isso e aquilo. Todo esse stress fica nos ombros do diretor e do produtor.
Deve ter sido legal fazer algo diferente durante a pandemia também.
Foi! Você está com 20 pessoas e juntos vocês vão fazer algo divertido por três dias e esse será seu trabalho por três dias. Foi muito divertido e foi uma experiência renovadora.
Para você, qual foi a importância de escrever e lançar uma música que fala sobre estar longe das pessoas que amamos, um tema que quase todos nós nos relacionamos atualmente?
Para mim, a música veio de um lugar pessoal, porque, quando eu escrevi, eu estava em Melbourne e minha namorada estava aqui, em Barcelona, e quando a pandemia da covid-19 começou foi tipo ‘Talvez nós não veremos por um ano’. Então, eu acredito que eu escrevi a partir dessa experiência, mas eu também não podia ver meus pais, muitas pessoas não podiam ver seus pais se eles estivessem do outro lado do país ou em um estado diferente ou apenas porque nós não queríamos estar perto de pessoas mais velhas. Eu acho que veio desse lugar pessoal e também desse senso que você disse, que muitas pessoas podem se identificar com isso. Eu estou feliz que a música conectou da forma que eu esperava que conectasse e da forma que eu esperava que repercutisse entre as pessoas.
Recentemente, Missing Piece esteve presente na trilha sonora de uma cena muito importante de Grey’s Anatomy. Qual é a sensação de ter a sua música tocada em uma série de TV tão famosa quanto Grey’s e saber que milhões de pessoas irão escutá-la?
Isso foi ótimo. Eu acho que foi um verdadeiro presente esse momento. Foi um momento tão bonito no seriado e eu fiquei muito lisonjeado que eles decidiram usar minha música. Foi um momento significativo para o seriado e um grande momento para o personagem. Eu também tenho ótimas memórias de Grey’s Anatomy, de como eles usavam a trilha sonora no seriado. Eles tocavam Snow Patrol e outros artistas e sempre era um grande momento, então eu me considero muito sortudo de fazer parte disso. Eu assisti novamente a cena e é linda, eu realmente acho que funcionou muito bem com a música. Criativamente, foi uma combinação adorável.
A música realmente ficou perfeita com a cena.
Eu concordo.
Em relação à pandemia, como foi esse período de distanciamento social para você e como o isolamento afetou sua música?
Eu fui muito sortudo durante esse tempo, porque todo mundo na minha família está bem e eu pude ver meus pais em Melbourne recentemente, nós pudemos flexibilizar nossas restrições. E em relação à música, foi bom. Me deu tempo para refletir. Eu acredito que, em termos criativos, é saudável ter tempos de quietude, porque, muitas vezes, bons pensamentos criativos vêm à tona quando você está quieto e não tem muito acontecendo, aí você pode ouvir a voz criativa da sua cabeça. Durante esse tempo, essa voz estava falando e eu estava ouvindo.
Você é um artista que quase sempre esteve em turnê. Como tem sido esse tempo longe dos palcos e quais são suas expectativas para se apresentar ao vivo de novo?
Sim. Eu acho que os primeiros shows serão muito especiais, animadores e catárticos. Catártico é a palavra perfeita. Eu acho que fará todo mundo se sentir feliz e que todos nós estaremos em uma experiência compartilhada de estarmos ‘Oh, eu gosto dessa conexão’. Mas, honestamente, eu amei o tempo que eu tive fora da estrada também, porque me deu tempo de ser um pouco mais ordinário e simples na minha rotina diária. Eu pude estar com a minha família um pouco mais, ver meus amigos e meio que estar mais permanentemente em casa também. Agora eu estou aqui em Barcelona, vivendo numa rotina legal e eu acho que quando você sempre está em turnê, você não consegue arrumar uma rotina. Você meio que, mesmo quando você vai para casa, você sabe que estará de volta em turnê em um mês, então você nunca tem que se comprometer com nada. Isso pode ser divertido e é divertido, mas, provavelmente vale a pena aprender a se cometer com coisas e ter essas coisas mais permanentes na sua vida, que podem te trazer uma felicidade em longo prazo e coisas do tipo.
Eu imagino que estar em turnê deve ser muito exaustivo também.
Sim. Pode ser exaustivo mesmo. É divertido também, mas, algumas vezes, é difícil. Como você disse, é uma linha tênue. Você pode estar em algum país aleatório, talvez no meio da América em algum lugar, e você pensa ‘Eu realmente deveria estar aqui?’. É ótimo para promover sua música, mas é legal ver o outro lado das coisas, o outro lado da moeda, e dizer ‘Essas são as coisas que eu gostaria de fazer e eu também amo estar em turnê’ para que talvez eu possa encontrar um bom equilíbrio entre os dois.
Falando em shows, você já esteve no Brasil algumas vezes. Como foi a experiência de se apresentar aqui e você tem planos de voltar no futuro?
Eu amaria voltar. Eu tenho certeza que eu voltarei quando tudo for possível e nós começarmos a viajar de novo e fazer shows. Eu amo o Brasil. O público brasileiro é o melhor, honestamente, eles são provavelmente as pessoas mais animadas e apaixonadas. Eu toquei no Rio e em São Paulo e eu lembro dos dois shows muito bem, a plateia deixou eu e minha banda eletrificados. Eles são o tipo de plateia que faz você se sentir como se você fosse a banda mais especial do mundo, eles fazem isso para todos os artistas e é assim que tem que ser. É mágico.
Você também tocou no Lollapalooza, né?
Sim. Esse show foi especial. Foi um daqueles shows que eu fiquei “Como assim? Como essas pessoas podem estar animadas para ouvirem uma música aleatória do meio do meu primeiro álbum?’. Foi tão apaixonante, foi a melhor coisa. Espero que se repita.
O público do Lollapalooza é exatamente o tipo de público que escuta e ama as suas músicas.
É isso. Foi por isso que foi a tempestade perfeita. Eu adoraria fazer outro Lollapalooza. Foi um sonho. Foi ótimo.
E nós adoraríamos ver você no Lollapalooza de novo.
Vamos fazer acontecer! Eu tenho certeza que voltarei. Vejo você lá.
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