O ano era 1988. A banda irlandesa U2 parecia viver o seu grande apogeu com o sucesso estrondoso de “The Joshua Tree”, que os consagraram como um dos fenômenos emergentes do rock e não só deu origem à canções que até os dias de hoje seriam relembradas, como “With Or Without You”, “I Still Haven’t Found What I’m Looking For” e “Where The Streets Have No Name”, mas também rendeu ao grupo um Grammy inédito de “Álbum do Ano” sobre ninguém mais, ninguém menos que Michael Jackson.
A enorme repercussão da combinação dos estilos musicais americano e irlandês parecia ser justamente a sonoridade que o U2 estava buscando para o restante de sua promissora carreira. Com isso, o quarteto aproveitou a bem-sucedida fórmula e decidiu apostar nela mais uma vez com “Rattle And Hum”, álbum que acompanhava o lançamento do documentário de mesmo título e reunia não só gravações ao vivo de músicas de seus antecessores, mas também faixas inéditas, tais como “Desire”, “Angel Of Harlem” e “All I Want Is You”.
Na época, o que Bono e companhia menos esperavam eram críticas por parte da mesma imprensa que os idolatraram apenas um ano antes. Mal sabia o grupo que tudo viria a cair ladeira abaixo com o gigantesco número de reações negativas sobre o trabalho, que “soava forçado demais” e era “uma consequência do estrelato”, conforme as opiniões populares o descreviam.
Os flertes do U2 com a crítica especializada, tal como os do Muro de Berlim com o solo de uma Alemanha sonhando com sua reunificação, haviam terminado. Era hora de recriar-se artisticamente, se reconhecer novamente e retomar o sonho de quatro irlandeses em busca de fama além dos oceanos.
Á procura de novas direções, a banda se mudou para a Alemanha, que parecia ser o grande berço criativo na época com a mistura de dois povos e pontos de vista separados ao longo de quase quatro décadas, por um ano. Essa difusão de ideias inspirou fortemente o grupo e introduziu-o às musicalidades industrial e eletrônica e ao movimento “acid house” que tomavam a Europa no final dos anos 80 e início dos anos 90.
Na intenção de reunir as influências interpostas em seu caminho, o U2 retornou aos seus estúdios em Dublin, na Irlanda, no ano seguinte para dar forma ao seu retorno ao cenário musical. Após chegar ao topo da colina com seus trabalhos anteriores, a banda retornou à estaca zero com “Achtung Baby”, lançado em um mesmo 18 de novembro há 25 anos atrás.
O título “Achtung Baby” deriva de uma expressão utilizada pelo engenheiro de som da banda, Joe O’Herlihy, onde “achtung” significa “atenção” em alemão. Segundo o vocalista Bono, o nome do álbum é perfeito em relação aos seus temas e combina com as intenções do grupo de chamar a atenção junto a sua capa, que reúne diversas imagens coloridas em contraste com as artes monocromáticas de seus antecessores
“Achtung Baby” se destaca por descontinuar a sonoridade presa a gêneros específicos, como o blues e o roots rock no caso de “The Joshua Tree” e “Rattle And Hum”, de seus antecessores. Para lançar-se de volta à indústria fonográfica sob uma nova musicalidade, o quarteto apostou em diferentes e inusitadas combinações, como a forte e sintetizada guitarra de The Edge com os vocais tímidos e reflexivos de Bono que resultaram no primeiro single do trabalho, “The Fly”.
O disco marcou a grande guinada de toda a carreira do U2, apresentando o lado escuro de sua Lua. Aqui, temos não só algumas das canções mais bem-sucedidas da carreira do grupo, como “Even Better Than The Real Thing”, “Until The End Of The World” e “Mysterious Ways”, mas também diversos significados líricos e instrumentais ocultos — como a exploração de conceitos amorosos, sexuais, pessoais e espirituais que se distanciam do teor político dos trabalhos anteriores— e que tornam o álbum talvez o maior projeto da banda.
Entretanto, as gravações de “Achtung Baby” não foram recheadas de êxitos e isenta de fracassos assim como o seu resultado final aponta. Nas sessões em Berlim, os integrantes da banda se envolveram em diversas discussões sobre qual caminho seguir, atrasando a produção do álbum em meses.
As tensões entre os membros fizeram com que o grupo não chegasse a nenhum consenso. Porém, foi em meio à formação do caos que surgiu “One”, uma das composições mais tocantes e introspectivas do U2 e que posteriormente, em 2003, foi eleita a melhor música de todos os tempos pela revista britânica Q, e em 2005 a 36ª maior canção da história pela Rolling Stone.
A canção, que foi produzida em pequenas partes improvisadamente, aliviou o grupo durante seu tempo de bloqueio criativo e seu poder, aliado à insistência dos produtores Brian Eno e Daniel Lanois, fez com que os membros voltassem a trabalhar juntos após seus turbulentos desentendimentos. Apesar de destoar do restante da sonoridade do disco, a banda insistiu em manter “One” na tracklist de “Achtung Baby” pelo sentimento de reunião que a faixa representa para os irlandeses.
Vinte e cinco anos depois, “Achtung Baby” ainda é reverenciado como um dos maiores álbuns da história da música e o capítulo mais importante e significativo de toda a carreira do U2. O disco mudou não apenas os rumos da carreira do grupo, que com ele abriu caminho para se tornar uma das maiores bandas dos anos 90, mas também revolucionou a maneira que o rock e o pop passaram a ser dirigidos a partir de seu lançamento.
Para a divulgação do disco, a banda preparou uma de suas maiores e mais compridas turnês: a aclamadíssima “Zoo TV Tour”, que passou por quatro continentes e contou com 157 shows ao longo de quase três anos. As apresentações eram verdadeiros espetáculos visuais, onde Bono cumpria muito bem o seu papel de frontman ao interpretar diferentes alter egos (é o caso de “The Fly”, personagem que, segundo o vocalista, se caracteriza por sua personalidade megalomaníaca) e os palcos usavam dezenas de telas de vídeo onde eram exibidos videoclipes de artistas pop e frases textuais que garantiram aos concertos um tom encenador, humorado e irônico.
“Achtung Baby” rendeu ao U2 um Grammy de “Melhor Performance Com Vocais de Rock (Duo/Grupo)” e uma indicação à categoria de “Álbum do Ano” e teve 18 milhões de unidades vendidas em todo o mundo. O disco provou ser uma verdadeira obra-prima atemporal e hoje completa vinte e cinco anos tão jovem quanto na época que chegou arrebatador às lojas. Torcemos que essa juventude e toda a sua intensidade, criatividade e qualidade nunca soe ultrapassada aos nossos ouvidos.