“Não Olhe para Cima”, novo filme de Adam McKay, estreou no última sexta-feira (24) como produção original Netflix. O filme, que é focado em um público completamente diferente comparado aos dois últimos longas de McKay, “A Grande Aposta” e “Vice”, aborda as diversas formas de ignorância de nossa sociedade, calhando com o momento atual em que vivemos.
O professor Dr. Randall Mindy (Leonardo DiCaprio) e a estudante de astronomia Kate Dibiasky (Jennifer Lawrence) descobrem um cometa está a caminho da Terra e poderá acabar com a raça humana.
“Não Olhe para Cima” é o filme mais acessível de Adam McKay
Se você já assistiu algum dos outros filmes de McKay, especialmente “A Grande Aposta” (2015), sabe que o diretor é especialista em comédias trágicas, que normalmente envolvem fatos reais. Em seu longa de 2015, por exemplo, o ritmo do filme é completamente diferente e repleto de explicações. A todo momento vivenciamos uma pausa na trama pra uma aula sobre os termos técnicos do mercado financeiro, o que quebra um pouco a conexão com o longa.
Isso não quer dizer que o filme (“A Grande Aposta”) é ruim, muito pelo contrário, é ótimo, com um excelente elenco, mas que não funcionaria como uma produção original Netflix e suas intenções de crescimento como empresa. “Não Olhe para Cima” conversa com um público diferente, mais jovem e que pode engajar com as mensagens do longa.
Um exemplo prático disso, assisti ao filme com meu irmão (19 anos) e meu pai (54 anos), em determinado momento, o personagem Yule (Timothée Chalamet) faz uma menção à Twitch. Eu e meu irmão achamos a piada ótima, demos boas risadas, enquanto meu pai não entendeu do que se tratava. Claro, existem pessoas de outras gerações que sabem o que é a Twitch, mas foi um exemplo prático de como “Não Olhe para Cima” conversa com um público diferente de “A Grande Aposta”.
“Não Olhe para Cima”, Elon Musk, pandemia e negacionismo.
Curiosamente, a Netflix adquiriu os direitos do filme antes mesmo da pandemia ter início, em Fevereiro de 2020. O longa não tinha elenco definido na época, apenas que Jennifer Lawrence participaria e o roteiro estava pronto. A produção começou, de fato, em Novembro de 2020, o que trouxe o fator da pandemia para o jogo, pois o filme passa por diversos tópicos que nos acostumamos a ver nos últimos dois anos.
Durante os últimos 24 meses nos acostumamos a ver algumas informações em nossos meios de comunicação: cientistas, negacionistas, debates acalorados na internet e Elon Musk. Mas como o bilionário se relaciona com a história de “Não Olhe para Cima”? Chegaremos lá.
A principal crítica do longa é sobre como as pessoas são capazes de questionar os cientistas que apresentam fatos comprovando algo como, por exemplo, a queda de um meteoro na Terra. Algo muito parecido com o que estamos passando atualmente com os questionamentos em relação à eficácia da vacina. A partir daí, tudo vira uma bola de neve. Quem quer lucrar com o meteoro? Em quem as pessoas devem confiar? Tudo começa a se polarizar.
Não é muito diferente do que vivemos no dia a dia, principalmente em relação a questão divisivas como governo, pandemia e até mesmo coisas mais simples como o futebol. A partir do momento que alguém com poder decide algo, teremos pessoas contra e a favor. E é interessante a forma como Adam McKay explora as redes sociais nesse fator. No momento em que surge o movimento “a favor” do meteoro, ele é representado nas redes majoritariamente por homens, de boné, óculos escuros e barba por fazer, em sua maioria brancos. Não muito diferente do que estamos acostumados a ver.
Esse movimento, inclusive, surge a partir do momento em que o governo decide mudar os planos de destruição do meteoro. Influenciado diretamente por um magnata que fala em um ritmo incômodo e tem planos descolados da realidade. É aí que entra a crítica a Elon Musk. Você pode gostar de Musk, mas o retrato que o filme traz sobre as “ideias geniais” que o empresário tem é bem interessante.
O principal deles, além de focar no lucro, é a corrida espacial. Muito se questiona quais as intenções de magnatas como Jeff Bezos e Elon Musk terem tanta intenção de sair do planeta com sucesso. E o filme aborda essa questão com maestria. E citei apenas Musk como o escolhido por McKay pois é clara a relação do personagem do filme com a personalidade do fundador da Tesla. Mas vou parar por aqui para não trazer muitos spoilers sobre o longa.
A participação de Ariana Grande no longa é outra forma que Adam McKay encontrou de criticar as prioridades da mídia e das pessoas nas redes sociais. A personagem Riley Bina, interpretada pela cantora, não passa de uma caricata representação de uma artista rasa que é politicamente ativa, mas não tem tanto conhecimento da causa. Em determinado momento, a atitude da cantora gera muito mais engajamento do que a notícia sobre o meteoro, mostrando onde estava a prioridade das pessoas.
“Não Olhe para Cima” é uma crítica de fácil compreensão
A produção de Adam McKay é simples, direta e de fácil compreensão, não são necessários vídeos explicativos após assistir o longa. “Não Olhe para Cima” uniu a facilidade da compreensão com o alto alcance da plataforma que é a Netflix, o que facilita para ambas as partes. Se o filme será lembrado na corrida pelo Oscar, ainda é difícil saber, mas que é um filme divertido e incômodo em diversos pontos, e que conversa diretamente com as novas gerações, isso é um fato.
Nota: 8,5