O resultado das eleições para a presidência nos Estados Unidos, que consagrou a vitória de Donald Trump, desagradou grande parte dos artistas musicais de todo o mundo, que em sua maioria apoiavam a democrata Hillary Clinton. Nesse meio estava Lauren Jauregui, integrante do Fifth Harmony que desde então tem expressado descontentamento com as decisões politicas do republicano em suas redes sociais.
Nove dias após a divulgação do resultado, a cantora enviou uma carta à Billboard voltada aos eleitores de Trump, onde comenta sobre temas como sexualidade, racismo, feminismo, descendência e as atitudes do presidente eleito que o levaram à vitória, chegando a compará-lo com Adolf Hitler, além de também assumir ser bissexual.
Leia a carta na íntegra em tradução para o português:
“A todos os apoiadores de [Donald] Trump que tentam dizer que votar nele não significa que vocês sejam racistas, homofóbicos, sexistas, xenofóbicos, babacas… Que vocês apenas gostavam da maneira que ele não se importava com o que as pessoas pensavam e que ele dizia o que quisesse… Que ele não era um político, então ele não era parte das politicagens e não tinha dinheiro corrupto às suas costas…
Isto é para vocês:
Suas palavras não valem, porque suas ações têm levado à destruição de todo o progresso que conseguimos socialmente como uma nação. Vocês, com sua pura ignorância e a recusa em compreender como o governo e o mundo funcionam, permitiram que um magnata faminto por poder tomasse os Estados Unidos da América. “A terra dos livres, o lar dos corajosos, sob Deus, indivisível, com liberdade e justiça para todos”.
Vocês são hipócritas.
Restaurar o que já foi a América está apenas estagnando o progresso de nossa consciência. Vocês votaram em uma pessoa que construiu uma campanha de 18 meses sobre seu ódio. Ele manipulou todos vocês com tanta facilidade falando com suas partes mais obscuras que vocês começaram a se sentir envergonhados com a maneira que víamos o mundo ‘politicamente correto’. Ele se tornou o seu campeão porque falou com partes de vocês que acham que vocês são superiores ao resto de nós (assim como Hitler fez na Alemanha antes do Holocausto! Apenas leia sua autobiografia: ‘Mein Kampf’).
Esse mundo politicamente correto que temos criado é apenas um mundo com etiquetas sociais onde temos exterminado a linguagem do racismo o porquê, onde temos estabelecido o feminismo como uma noção crescente de fazer as mulheres perceberem seu valor e seu direito de serem tratadas como os complexos seres que elas são junto aos homens (que claramente precisam de muito trabalho considerando como as mulheres pela América, especialmente as brancas, votaram nesse homem que insultou sua existência toda vez que abriu sua boca ou desrespeitou Hillary [Clinton] ao longo de sua campanha), onde tivemos que criar diversas rotulações para ajudar as pessoas LGBT que não se encaixavam no molde cis e heterossexual a se sentirem válidas e identificáveis com um mundo onde consciências fechadas as fizeram sentir inúteis e invisíveis por tanto tempo. É esse o comportamento ‘politicamente correto’ que vocês querem se livrar? Vocês querem restaurar a América para um mundo onde os seres humanos em sua volta se sentem com medo de si mesmos e de viver e amar livremente?
Além do quão egoísta isso é, também é tão distante de Cristo, porque seu Deus está assistindo e Ele conhece seus corações e está ciente do verdadeiro motivo de vocês terem escolhido esse humano para liderar o país mais poderoso do mundo, e eu prometo a vocês que o Deus que eu tenho conhecido e amado é intolerante a julgamentos e ao ódio. E eu sei disso porque eu cresci como uma católica romana em uma casa latina e frequentei uma escola particular católica por toda a minha vida, então eu tenho estudado muito mais do que a maioria de vocês que estudaram suas religiões ou a Bíblia. O único motivo é a sua impossibilidade de aceitar o mundo crescente ao seu redor. Vocês escolheram o ódio. Os corações de vocês escolheram se separarem como superiores enquanto o único superior em existência nesse universo inteiro é tão mais grandioso que vocês.
Nosso ‘politicamente correto’ que o seu campeão, Donald Trump, desconsiderou tão pontualmente durante a sua campanha inteira e prossegue com a eleição de seus assessores e de outros oficiais do governo, é a linguagem que temos trabalhado incansavelmente para assim nos sentirmos seguros em um mundo que nunca para de nos lembrar que somos minorias. Eu sou uma mulher cubana-americana bissexual e sou muito orgulhosa disso. Sou orgulhosa de ser parte de uma comunidade que projeta apenas amor e educação e ajuda uns aos outros. Sou orgulhosa de ser a neta e a filha de imigrantes que foram corajosos o suficiente para abandonar suas casas e irem à um novo mundo com idioma e cultura diferentes e imergirem nele para começarem uma vida melhor para si mesmos e suas famílias.
Sou orgulhosa de ser uma mulher. Orgulhosa que o sexo entre as minhas pernas me forneça força e resiliência que apenas outras mulheres podem sentir, que as curvas do meu corpo garantam vida dentro de mim, que a minha vida inteira é repleta de adversidade e dúvida, com as pessoas questionando minha inteligência, meu potencial artístico, minha auto-expressão e minha virtuosidade e honra porque eu sou muito mulher. Sou orgulhosa de poder provar que tudo isso está errado. Sou orgulhosa de que eu tenha que trabalhar ainda mais por isso. Eu fui criada para sentir que eu posso fazer qualquer coisa, e eu vou sempre acreditar nisso. Sou orgulhosa de sentir o espectro inteiro de sentimentos e eu vou contentemente levar as definições de ‘vadia’ ou ‘problemática’ por falar o que eu penso da mesma maneira que um homem deve ser admirado e respeitado pelo mesmo. Mas eu também vou estender minha mão com compaixão e empatia a qualquer um que me rotular assim.
Eu também sei que na minha luta em ser uma mulher eu sou muito privilegiada. Eu nasci com uma tez mais clara e olhos verdes (graças à genética), então para essa perspectiva fechada, eu sou branca. Eu experimentei o privilégio que esses genes me garantiram, e sou grata e vou continuar a falar em nome das mulheres pelo mundo e em nosso próprio país que não experiencia uma fração de respeito pelas cores de suas peles, ou pelo o que elas escolhem vestir, ou pelo o que seus cabelos parecem, ou por quanta maquiagem elas usam ou por qualquer outra absurdidade que as mulheres são reduzidas.
É verdadeiramente despedaçador para mim ver mulheres tão bonitas que não têm ideia de seu potencial. Essa eleição tornou isso descaradamente óbvio o fato de que muitas mulheres não conseguem enxergar isso. Nós temos falhado com nossa nação. Nós somos o exemplo para o mundo, e nós temos falhado com nossos parceiros humanos que nos assistiram com esperança de que não deixaríamos o ódio prevalecer. Eu tenho o privilégio de estar em uma banda que tem me permitido viajar por todo o mundo. Eu não consigo expressar a gratitude que eu tenho por essa experiência que abriu meus olhos a tantas e tem me deixado ver o mundo por uma simples perspectiva, uma perspectiva que eu entendo que poucas pessoas têm a oportunidade de experimentar.
Se eu pudesse a dizer a todos os apoiadores de Trump duas coisas, seriam: viajar e ler um livro de história. Olhem para além de vocês mesmos, olhem o quão insignificante as morais que vocês defendem são quando perceberem que não somos os únicos. Percebam que suas peles brancas é o resultado da imigração de europeus, que os únicos ‘verdadeiros americanos’ são os nativos, que são indígenas que habitaram essa terra antes que os conquistadores desses países (Inglaterra, França, Itália, Espanha) acabassem com eles quase que completamente. Nenhum de nós pertence aqui, mas todos nós merecemos o direito de nos sentirmos seguros e vivermos nossas vidas em paz. De não nos preocuparmos de potencialmente morrermos, ou sermos eletrocutados, ou espancados, ou estuprados, ou abusados emocionalmente porque nossa existência e/ou escolhas para nós mesmos chateou alguém. Esse é o mundo que Trump está fomentando. Essa é a divisão que tem ascendido desde o início dessa campanha. Nós não somos mais a América indivisível, nós estamos separados em dois lados separados: amor e ódio. Nos não estamos ‘lamentando’ a derrota da nossa escolha para presidente, estamos gritando os gritos de batalha contra aqueles cujas agendas política e pessoal ameaça nossas vidas e sanidades. Nós estamos tendo certeza que vocês nos ouvem, não importa o quanto isso os incomoda, nós existimos.”