Quando surgiu para o mundo com Born to Die, em 2012, Lana Del Rey trouxe ao mainstream um pouco de pop ‘não tão pop assim’. Embora o álbum tivesse suas falhas – quase todas as faixas deixavam de atingir um clímax, ou de ter seu potencial desenvolvido ao máximo – era algo que faltava numa mídia tomada pelo ‘pop sexual’ de Lady Gagas e Keshas e pelo efeito visual. Para deixar a comparação mais clara, vamos desenhar um cenário: a melancolia de “Summertime Sadness” demonstrava que Lana era a ovelha negra do gênero, mas não no contexto ruim da expressão. Era, simplesmente, a ovelha triste, que preferia lamentar a vida a sair saltitando pelas pradarias com as outras ovelhas.
A questão é que Born to Die, embora destoante dentro de seu gênero, conseguia ressonar com o público e demonstrava potencial. E muito desse potencial aparece em Ultraviolence, o terceiro álbum da nova-iorquina. Produzido em parceria com Dan Auerbach, da banda The Black Keys, pode-se dizer que o disco toca como uma trilha de um filme: é só fechar os olhos e imaginar uma jovem, com tendências auto-depreciativas, vivendo uma vida em preto e branco nos subúrbios de Los Angeles (e não Nova Iorque) e se envolvendo com pessoas de integridade contestável.
A faixa-título “Ultraviolence” é um dos destaques: levada por um piano assombroso, ela diz “ele me machucou / e pareceu como um beijo”. Lana sempre fez questão de ressaltar o lado ruim dos relacionamentos, e isso está escrito por todo o álbum. Uma das exceções é “Brooklyn Baby”, na qual o relacionamento não é auto-destrutivo e seu parceiro não é um cafajeste. É a faixa mais ‘feliz’, um feixe de luz na escuridão. “West Coast” é a canção mais influenciada por Auerbach, e uma das mais destoantes, alternando entre o soft rock nos versos e o surf rock no refrão, com a sensibilidade blues oferecida pelo guitarrista e produtor.
“Money, Power, Glory” e “Fucked My Way Up to the Top” são um combo que vai deixar as feministas de cabelo em pé, no qual a cantora oferece seu lado venenoso, aproveitador. Ambas parecem ser cantadas enquanto ela pinta as unhas de vermelho e se prepara para aguentar algum quarentão rico assediando-a por algumas horas, só pra roubar cada centavo dele no final da noite. É uma pausa bem-vinda no meio do clima de “o mundo é horrível e tudo é triste” do álbum, o qual pode cansar ou, por vezes, até irritar o ouvinte.
Algo que imediatamente salta aos ouvidos é a ausência de batidas de hip-hop, como no álbum anterior. Aqui, elas são sempre lentas, sutis, atmosféricas. E não poderia ser diferente: elas contribuem para o ‘climão’ de Ultraviolence, por assim dizer, e o álbum não seria tão íntegro sem elas. A produção é, no mínimo, a melhor no meio pop, com guitarras ríspidas submersas no ambiente dominado pelos vocais reverberados de Lana.
A temática de Ultraviolence não destoa muito da de Born to Die, e pode dar às ouvintes femininas uma pequena vontade de se atirar na frente do maior ônibus que estiver passando na rua no momento – prazer, Lana Del Rey. É um álbum mais difícil de gostar, mais ‘entediante’, no sentido de não roubar sua atenção imediatamente, e levar alguns dias para ser digerido. Talvez falte um pouco de atitude: as letras passam a impressão de que a mulher é um ser muito mais frágil e passivo do que realmente é. Lana já não é mais nenhuma garotinha e, se o conteúdo lírico reflete sua vida, já passou da hora de levantar a cabeça, não? Ou será que a fragilidade e submissão são o que fazem a cantora ser esse poço de depressão cruelmente cativante?
Nota: 7/10