“Moraes É Frevo” é um álbum idealizado por Davi Moraes e Pupillo, ao lado do produtor Marcelo Soares, em celebração aos frevos compostos por Moraes Moreira (1947-2020). Ao lado de artistas como Maria Rita, Criolo, Lenine e Céu, com arranjos de maestros das ruas de Pernambuco, Davi Moraes conta mais, em entrevista ao Tracklist, como foi a produção do projeto, o desafio de adaptar as canções a uma sonoridade mais atual, a importância do álbum no contexto histórico do frevo e mais.
Entrevista: Davi Moraes fala sobre o álbum “Moraes É Frevo”
Tracklist: Em “Moraes É Frevo”, a produção foi feita em três etapas, certo? Houve alguma dificuldade em unir cada parte do processo (base, arranjos e vozes)?
Davi Moraes: Sim, ao mesmo tempo que fluiu muito bem, é um grande desafio gravar um disco que tenha três cidades diferentes como base: Rio de Janeiro, Recife e São Paulo. A partir do momento que escolhemos o repertório, chamamos o Kassin e gravamos as bases em três dias, guitarra, baixo e bateria. Depois, distribuímos os arranjos para cada um dos quatro maestros.
Houve o desafio que só poderíamos gravar as vozes depois dos sopros gravados. Então, cada vez que chegava os sopros, nós tínhamos que direcionar para os artistas e se adequar com a agenda concorrida de final de ano. Mas houve uma entrega muito especial dos intérpretes e arranjadores, com bastante carinho, vontade de fazer, de realizar tudo isso, de todos os envolvidos. Acabou que a gente conseguiu terminar há tempo e fazer o que mais desejávamos: realizar o lançamento antes do carnaval. Foi um grande desafio, mas que deu tudo certo no final.
Como foi ouvir pela primeira vez as canções finalizadas?
Sempre é bom responder esse tipo de pergunta: para nós músicos, sempre temos uma sensação única que é a primeira vez que escutamos a canção. A primeira vez que a gente escutou os sopros, tivemos uma sensação muito forte de sermos realmente uma banda, sem divisão do trio de guitarra, baixo, bateria e os sopros. Aquilo se juntou e teve uma química muito forte, parecia uma banda com muita intimidade, já tocando junto há muito tempo, e a primeira vez que a gente escuta é de arrepiar.
E assim foi quando elas foram finalizadas pelo grande Arthur Luna, um engenheiro de som super premiado que viajou com a gente, estava na estrada com a gente e o chamamos, ele é um super designer de som, um engenheiro de som que tem uma habilidade incrível para fazer tudo soar alto, você escuta cada detalhe, cada nota, cada sopro, então entregamos na mão dele e ia fazendo, dando um toque ou outro através das mensagens, mas quando você tem um grande engenheiro fazendo um disco, mixando e masterizando, a melhor coisa que você tem é deixar ele trabalhar sozinho, pontuar uma coisa ou outra, mas no final ele já mandou tudo pronto e ficamos muito felizes com o resultado da sonoridade forte desse disco.
Houve algum desafio em adaptá-las para uma sonoridade mais atual?
Sim, houve esse desafio, ainda mais porque a gente usou um disco todo gravado com instrumentos tocados de verdade, não tem essas coisas tão usadas hoje que dão uma pressão enorme, bateria eletrônica, mais programações.
É um disco tocado com uma pegada muito clássica, mas também tem algo muito atual e eu acho que a gente tem certas características que trouxeram este tom moderno para o disco, por exemplo, a não presença de teclados e sintetizadores, isso do power trio de guitarra, baixo e bateria junto com os sopros, e a sonoridade que a gente chegou, ao mesmo tempo tão clássica e tão forte, com tanta pressão, que foi uma união de nós, eu, Pupillo, Kassin, Arthur Luna que mixou, e chegamos em um resultado que queríamos, de um disco com um som muito atual, muito forte, ao mesmo tempo com muita tradição, com um ar clássico também, e acho que juntou essas duas características muito bem nesse disco.
Eu destacaria as interpretações desses grandes artistas do disco que também trazem algo muito atual, são artistas de uma geração nova e que deixaram o disco com uma sonoridade muito contemporânea, muito moderna, junto com toda a parte da banda.
E como foi fazer esse convite para trazer diversos artistas para contribuir com o disco?
Foi uma união muito bem sucedida entre Pupillo e eu, porque ele tinha uns contatos mais próximos de uns e eu de outros, então a gente dividiu e cada um foi atrás de fazer o convite e as respostas eram muito animadoras. A cada resposta a gente ficava mais feliz, mais empolgado, e a gente escolheu com muito carinho esse time. Acho que juntou uma galera muito interessante, diversa, de artistas de gerações mais novas que meu pai, mas também outros artistas que são colegas dele e o resultado final deu uma beleza, uma novidade, um propósito de novas vozes nesses clássicos, que acho que é um grande trunfo do disco.
De que forma esse trabalho se encaixa na importância do contexto histórico do frevo, aliado à carreira de Moraes Moreira, no meio musical?
Acho que é de uma importância muito grande, em todos os aspectos dessa pergunta. Sobre o contexto histórico do frevo, que está inclusive contado em algumas composições, meu pai contava da chegada do frevo de Pernambuco para a Bahia e a influência e o sotaque de um no outro. A importância do frevo na carreira do meu pai é gigantesca. Ele sempre foi um frevista que nunca deixou de lado essa ligação dele, que foi como ele começou: os grandes primeiros sucessos nacionais dele foram frevos, quando ele partiu para a carreira solo.
No meio musical, acho que traz de volta músicas, interpretações e arranjos que mostram também como isso tudo está vivo nas gerações mais novas, e para os fãs que sempre curtiram, eu acho que o disco teve um propósito maravilhoso alcançado no resultado, desde repertório, interpretações, arranjos, capa, quem tá tocando, então, foi um grande gol que a gente fez, no sentido dessas coisas destacadas na pergunta, eu acho que ele chega realmente muito forte, com uma grande importância e vai ficar aí por muito tempo com certeza.