Miley Cyrus foi o retrato do mundo pop em 2013. “Banger”, é uma gíria americana, adjetivo de algo ou alguém que é muito legal de um jeito diferente. E é isso que a artista propõe no disco: ser diferente do que o resto do mundo pop estava fazendo. E deu certo, em “Bangerz”, Miley deu a nova geração o gostinho do que quem acompanhava Britney, Christina Aguilera e Timberlake no começo dos anos 2000 sentia: o pop em todos os cantos. Miley era pauta em todos os lugares. Tudo que ela fazia virava meme. Os clipes explodiam no YouTube, suas apresentações em awards eram sempre as mais esperadas e tudo que a cantora vestia virava fantasia.
Mas o que gerou a revolta artística para a criação de um dos discos (Ou quem sabe O disco) mais controversos da década?
Destiny Hope Cyrus nasceu em 23 de novembro de 1992, no berço da country, a cidade de Nashville. Existe algo importante a dizer sobre Miley: ela nunca foi uma garota humilde que queria ser cantora para sustentar a família. Miley é filha de Billy Ray Cyrus, um famoso cantor country americano, cresceu rica, vivendo em fazendas grandes, esteve sempre cercada de astros da música, como a madrinha Dolly Parton. Aos 13 anos conseguiu um contrato com a Disney, e antes dos 15 já havia ganhado seu primeiro milhão de dólares. A cantora sempre teve os melhores técnicos, produtores e empresários que a Disney podia conseguir, e assim, foi construindo aos poucos um nome, que em 2010 começava a se chocar com o da personagem que interpretava, a doce Hannah Montana.
Em um grito confuso de fúria, Miley lança em 2010 o álbum “Can’t Be Tamed”, primeiro fracasso da carreira musical da jovem. E olha, ainda bem que fracassou, pois foi isso que trouxe Miley ao ponto onde ela se encontra hoje. Ainda naquele ano, Miley finalizou Hannah Montana, e começou a se envolver em várias polêmicas, começando pelo episódio da sálvia. Em 2011, entrou em turnê pela América Latina e Oceania, assumiu uma postura mais hippie, e começou a gravar um álbum que desistiu no meio porque não sabia para onde ir.
“Bangerz” só começou a ser gravado mesmo em 2012. Miley encerrou contrato com a Hollywood Records, e decidiu não assinar com nenhuma gravadora de imediato. Ela queria criar o conceito de um cd sozinha, sem a opinião de uma corporação. O problema é que ela não sabia para onde ir. Após vários anos ouvindo o que deveria fazer, Miley não sabia o que ela gostava de fazer. “Quando comecei a gravar esse CD, eu não sabia qual era meu estilo, não sabia qual era o meu tipo de som, eu descobri tudo enquanto estava nos estúdios”, contou Miley para a MTV no documentário que estrelou.
Antes de começarmos a entrar no álbum. Existe algo que vocês precisam saber. Bangerz é uma espécie de audiobook. Ele conta uma história. De Adore You até Someone Else Miley explica aos seus ouvintes a resposta da infame pergunta: O que aconteceu com a antiga Miley?
A primeira faixa gravada para Bangerz foi “Adore You”, música que abre o cd. Composta e produzida por Oren Yoel (Que recentemente trabalhou de novo com Miley nas maravilhosas ‘BB Talk’ e ‘Space Boots”), a faixa foi gravada ainda no primeiro semestre de 2012, e fala sobre a sensação de encontrar a pessoa certa, sobre amar, em certo ponto, até cegamente. A música, que obviamente se trata de Liam, foi escolhida como terceiro single do Bangerz após o bom desempenho durante o lançamento do álbum, mas não foi uma decisão bem recebida pelos fãs.
when you say you love me know I love you more.
— Miley Ray Cyrus (@MileyCyrus) 30 de junho de 2012
Em fevereiro de 2014 a faixa recebeu um remix feito por Cedric Gervais. Durante a Bangerz Tour, Miley declarava que essa era uma faixa sobre o amor, e que enquanto ela cantava, gostaria que os fãs se beijassem para que suas imagens aparecessem no telão. Confira a apresentação abaixo:
Bangerz começou a tomar formato após Miley publicar no YouTube uma apresentação que fez no quintal de casa da faixa “Jolene”, imortalizada por sua madrinha Dolly Parton. O vídeo chegou ao produtor Pharrell Williams, que entrou em contato com a cantora para saber qual seria o próximo passo da carreira e como ele poderia ajudá-la. E foi tudo que Miley precisava ouvir. Pharrell já havia trabalhado com cantoras que – direta ou indiretamente – influenciaram muito o trabalho de Miley no álbum: Britney Spears, Gwen Stefani e Madonna. A participação dele no cd rendeu mais que produções para faixas, mas a criação do conceito do disco.
E qual é o conceito que eles criaram juntos? O de uma bagunça. Bangerz é uma festa que envolve gente de todas as tribos, e que toca todos os estilos de música. Miley e Pharrell criaram juntos as faixas 4×4, Get It Right, On My Own e Rooting For My Baby. A principal delas, Get It Right, foi inicialmente escolhida como primeiro single do álbum, mas acabou sendo substituída. É uma faixa que narra o relacionamento de um casal que vive separado devido a loucura dos horários, mas que está com bastante vontade de se encontrar para poder transar. A música foi chamada pela Billboard de “Parente rica e fina de ‘Blurred Lines’ e ‘Get Lucky’”, hits também produzidos por Pharrell.
A faixa 4×4 (Que representa a caminhonete 4×4), foi escolhida como quarto single do Bangerz, mas devido aos problemas emocionais e de saúde que Miley sofreu após a morte de cachorrinho Floyd, foi cancelada.
O primeiro single do álbum, é a faixa que melhor o representa: We Can’t Stop. A música foi escrita e produzida por Mike Will Made It – responsável por grande parte do álbum -, e chegou a ser oferecida para Rihanna, que não aceitou.
Mike e Miley não se conheciam até a faixa ser gravada. Miley estava em L.A quando ouviu falar de Mike, que tinha um estilo parecido com o que ela queria, e ainda não estava tão na boca das cantoras pop. “Ele tinha uma idade próxima a minha, então pensei que poderíamos fazer algo legal e diferente juntos”, explica Miley. Quando os dois se conheceram, a conexão foi mútua. Miley levou Mike para a vida pessoal, e os dois se tornaram grandes amigos. We Can’t Stop foi a primeira música em que eles trabalharam juntos.
Ambos reescreveram a faixa para que ela ficasse mais parecida com a proposta de Miley para o álbum, e em 03.06.2013 ela foi apresentada ao mundo como o retorno da rainha da Disney a música. De princípio, a RCA não apostava na faixa, que só foi escolhida por pressão da cantora. “Eu estava há três anos fora das rádios, eu queria voltar tendo algo a dizer. E essa faixa tem uma liberdade que queria transmitir aos meus fãs”, conta. We Can’t Stop foi #1 no iTunes USA em poucas horas, mas após uns dias acabou caindo. O que ajudou a faixa a se tornar um hit, foi o vídeo viral, um dos mais icônicos dos últimos anos.
Mike e Miley ainda trabalham juntos nas faixas “SMS (Bangerz)”, “My Darlin”, “Love Money Party”, “Drive”, “Maybe You’re Right”, “Someone Else” e “Hands In The Hair”. Uma das mais amadas pelos fãs, “Drive”, foi escrita por Miley no dia dos namorados de 2013, falando abertamente sobre Liam. É uma música sobre estar em um relacionamento fadado ao fracasso, mas mesmo assim não conseguir desistir da pessoa. (Mas se eu me apaixonar por você de novo / a idiota serei eu / Se o nosso amor está no final / Então, por que eu ainda te quero tanto?)
Mesmo estando em um beco sem saída, em Drive, Miley quer ficar com seu amante por pelo menos mais uma noite. Então Miley pede que Liam passe a noite com ela, e que na manhã seguinte eles podem se separar. (Dirija meu coração pela noite / Você pode devolver as chaves pela manhã). Na faixa, Miley revive um verso de “When I Look at You”, música que serviu de trilha sonora para o filme “The Last Song”, em que Miley e Liam contracenaram juntos e acabaram se apaixonando. Na música de 2009 Miley cantava “Quando eu olho para você, vejo perdão, eu vejo a verdade”. Quatro anos depois, em Drive Miley diz “Para mim tudo acabou, agora tudo que eu sei são os fatos, quando eu olho nos seus olhos tudo que vejo são mentiras”.
Durante a gravação de Bangerz, Miley decidiu passar uns dias na Filadélfia, onde pode ter a vida de uma garota normal. Em entrevista, ela disse que era exatamente o que ela precisava: sair na rua sem ser reconhecida, poder passear com seus cachorros e pensar. E foi na Filadélfia que Miley Cyrus encontrou o tesouro do Bangerz. Em uma reunião de amigos, ela conheceu MoZella. A compositora, que até aquele momento não havia conseguido emplacar nenhuma de suas composições, sentou em frente ao piano e tocou para Miley uma música que estava tentando vender para Beyoncé. Aquela era a primeira vez que Miley ouvia seu futuro hit #1, “Wrecking Ball”. Diferente do que muitos noticiaram, Beyoncé nunca rejeitou “Wrecking Ball”, pois a faixa nunca chegou a ser oferecida a diva. Após a primeira audição, Miley mostrou a versão em piano da faixa para Dr. Luke, com quem ela já havia trabalhado em “Party in the USA” e “Permanent December”, que ajudou a transformar a música no hino que ela é hoje.
MoZella teve a vida mudada após o sucesso de “Wrecking Ball”. Além de trabalhar com Miley nas faixas “FU” e “Someone Else”, ela ainda foi a principal compositora do “Rebel Heart” da Madonna, e escreveu faixas para o One Direction, Kelly Clarkson, Tinashe e Rihanna.
O mundo conheceu “Wrecking Ball” no dia 25 de agosto de 2013, como segundo single do “Bangerz”, vendido junto da pré-venda do CD. Lançada no domingo do VMA, a faixa vendeu 50 mil cópias em 24 horas. Em setembro, o clipe do single foi lançado, gerando 19.6 milhões de visualizações em 24 horas, e mais de 100 milhões em seis dias. O vídeo rendeu o VMA de “Video of the Year” de 2014. Poucos dias antes do anúncio dos indicados ao Grammy 2014, o jornal americano USA Today publicou que a bancada havia boicotado Miley pelo seu estilo provocante, e que mesmo sendo uma das favoritas, Wrecking Ball não receberia nenhuma indicação a premiação. O que acabou se concretizando. A faixa foi #1 no Hot 100 da Billboard por três semanas, e também atingiu o topo das paradas da Canadá, UK, Espanha e Portugal.
Desde “Adore You”, Miley vai contando durante o CD como andava sua vida tendo o relacionamento com Liam como gancho. A primeira faixa é o amor puro, que começa a passar por festas, curtições e diversões. As primeiras dúvidas e dores chegam em “Wrecking Ball”, traições e mágoas fazem o sofrimento se torna insuportável em “FU” e “Drive”, e trazem o final do relacionamento. Em “Maybe You’re Right” chega a aceitação. E em “Someone Else”, Miley mostra o que todas as vertentes do relacionamento fizeram com ela.
Na faixa produzida por Mike e escrita por Miley, a cantora mostra sua atual visão sobre o amor. (Eu acreditava que o amor vencia tudo / Pois isso era o que eu via nos filmes / Descobri que não é nada disso / Você vê que a vida real é muito diferente). Miley ainda vive as dúvidas sobre estar fazendo a coisa certa. (Me abrace, não me solte, eu espero que / Você me diga que agora não é o fim). No refrão, a cantora entona. (Se você está procurando por amor / Saiba que o amor não mora mais aqui / Ele foi embora com o meu coração /Os dois saíram por aquela porta, sem mim).
Após uma forte batida de EDM, Miley se prepara para finalizar o álbum mais importante da sua carreira. E como ela decide fazer isso? Citando a bíblia. Na primeira epístola aos Coríntios, Miley usa os versículos sobre o amor, dos capítulos 13 e 14, para recitar uma das partes mais fortes do cd, onde ela grita: “O amor é paciente/ O amor é altruísta/ O amor é esperançoso/ O amor é Deus/ O amor é ciumento/ O amor é egoísta/ O amor é indefeso/ O amor é cego”, cada verso saindo de uma orientação cristã sobre o amor impressa na bíblia
A última frase que Miley canta na versão comum do CD é o que a resume: I’ve turned into someone else (Eu me transformei em outra pessoa).
10 notas sobre o Bangerz:
- Originalmente, “SMS (Bangerz)” não foi feita para ser um feat com Britney Spears, boatos apontam que a colaboração original seria com Nicki Minaj. Porém, por Miley e Britney serem da mesma gravadora e possuírem o mesmo empresário, o dueto foi facilitado, e elas decidiram gravar juntas.
- “My Darlin’” contém sample de “Stand By Me”, de Ben E. King. Originalmente, a faixa de Miley também se chamaria “Stand By Me”, mas foi alterada.
- Tirando os singles, “Do My Thang” foi a faixa do álbum que mais vendeu e mais recebeu streams.
- Miley gravou 39 canções para o álbum, apenas 16 entraram. Entre as que não foram escolhidas, já vazaram na internet “Last Goodbye”, “Nightmare” e “Pretty Girls (FUN)”.
- “FU” quase foi o terceiro single de Bangerz. Após ser tocada no Victoria’s Secret Fashion Show 2013, a música voou para o Top 30 do iTunes, fazendo a gravadora questionar a escolha de “Adore You” como single. Infelizmente, acabou não indo para frente .
- Antes do lançamento de “Bangerz”, a expectativa era que pelo menos cinco singles fossem lançados para promover o álbum. Mas devido aos problemas que Miley teve em 2014, apenas três saíram.
- Em “We Can’t Stop”, Miley brinca com a semelhança do seu nome com a droga “Molly”. Em “We like party, dancing with Miley”, o sotaque sulista da cantora faz da impressão que ela fala “dancing with Molly”.
- Além das capas da versão standard e deluxe, Miley lançou mais quatro capas extras para o Bangerz, que vinham dentro do álbum. Junto com o encarte, os fãs também levavam para casa uma cartela de adesivos exclusiva com símbolos da era.
- O DVD oficial da “Bangerz Tour” foi gravado nos shows em Barcelona (ESP) e Lisboa (POR), mas por ter sido exibido na TV, o show foi bastante censurado. Para quem quiser ver a verdade “Bangerz Tour”, existem na internet os shows completos de Londres (UK), Monterrey (MX) e Nova Orleães (US) gravados profissionalmente
- Miley apresentou as faixas do álbum em um MTV Unplugged, que você pode conferir aqui
Bangerz passa longe de ser um álbum perfeito. Tem bastante erros. É muito bagunçado, começando pela tracklist: primeira metade do disco é mais BEM mais fraca que a segunda, o que pode fazer alguém que está ouvindo o álbum por curiosidade perder o interesse no meio. Midiaticamente falando, a era começou muito bem, mas morreu após “Wrecking Ball”. “Adore You” foi uma péssima escolha de single, porque não condiz em nada com o resto do álbum, é a faixa mais avulsa do cd. Após AY, o cd parou de ser trabalhado, e os verdadeiros hinos (“Do My Thang”, “FU”, “Drive” e “Someone Else”, por exemplo) morreram sem ver a luz do dia.
Porém, “Bangerz” é o álbum pop que faltava para a atual geração. Miley Cyrus é a artista que faltava na atual geração. Em uma primeira olhada, Miley Cyrus pode parecer apenas uma stripper desafinada, mas se analisada, ela têm um dos timbres mais belos da música pop, uma técnica vocal que a deixa vocalmente superior a muitas cantoras com mais extensão, e uma criatividade (musical, artística e midiática) que a deixam sempre um passo a frente das concorrentes. Ela é feroz, é virtuosa, não tem medo de pagar vexame (O que a faz sempre conseguir inovar e acertar antes dos outros, porém, também a faz errar muito e ser motivo de chacota), e está sempre mudando. “Bangerz”, já é completamente diferente do experimental “Dead Petz”, lançado em 2015. E o futuro? Ah, o futuro de Miley Cyrus deve ser a maior incógnita do mundo pop.
Durante a “Milky Milky Milk Tour” em dezembro de 2015, Miley disse que já estava trabalhando em um novo álbum. Após isso, pouca coisa foi falada. Boatos entre fansites dizem que o próximo álbum será lançado pela RCA (atual selo da cantora), e que será comercial. Nos últimos meses a gravadora insistiu que Miley voltasse a andar com guarda costas, e tabloides americanos dizem que o investimento financeiro da nova era será o dobro do gasto no “Bangerz”.
Atualmente, a cantora é jurada da 11ª temporada de The Voice, e está bem engajada em causas sociais e políticas. Na última semana, quebrou o silêncio e enquanto fazia campanha para Hillary Clinton contou a fãs que estava de volta à Los Angels para gravar novas músicas. O estilo ainda é um mistério, vindo de Miley Cyrus, pode ser country, indie, pop, rap ou até mesmo gospel. Pois se tem algo que deve ser admirado na cantora, é o quanto ela muda. Miley, assim como Madonna em sua melhor fase, nunca lançará dois álbuns iguais, nunca vai repetir uma fórmula só para ganhar dinheiro. Miley Cyrus é única no atual mercado musical. E ela sabe disso. Por isso é uma das poucas cantora que consegue se dar ao luxo de lançar um cd gratuito e tirar um ano apenas para lutar por suas causas sociais, pois sabe que quando voltar, seu lugar ainda estará vago.
Só não demore muito, Miley, pois o mundo já está precisando de algo para falar.