E começa, assim:
Eu: Oi, Bárbara, tudo bom? Vamos começar uma série de entrevistas com minas Rappers por aqui e pensamos em você para ser nossa primeira entrevistada. Vamos começar?
Sweet: Que lindo, que massa! Vamo aí!
Bárbara Sweet é uma Mc de Belo Horizonte que estourou nas redes sociais ano passado por fomentar debates feministas nas suas falas. Foi justamente em uma dessas falas, em rimas, necessariamente, que ela se tornou uma voz marcante e poderosa na cena do Hip Hop. O vídeo que a fez viralizar foi a Batalha de Rap do Santa Cruz em São Paulo que responde versos inteligentíssimos ao seu adversário. Com 13 mil likes e 11 mil compartilhamentos, esse vídeo foi um boom em sua carreira. Nos comentários, aplausos de mulheres e de quebra um elogio do rapper Emicida.
Meio tímida e um pouco nervosa, a convidei para nos dar uma entrevista. Ela pediu que adiasse a conversa para o horário da tarde, pois iria deixar a filha da escola. Enquanto fez o percurso de deixá-la no colégio, pude entender e pesquisar ainda mais sobre o universo dessa mulher que tem feito tanta coisa legal para empoderar as mulheres da cena do Rap e Hip Hop do Brasil.
Sweet hoje é uma das vozes do feminismo do país e pelo que ouvi, não se sente intimidada por nada. A Mc conta sobre seus projetos independentes, machismo, seu primeiro disco e influências musicais.
Comecei perguntando de onde vem o Sweet e Bárbara docemente me disse que ganhou o apelido ainda pequena, numa escola Estadual em Belo Horizonte.
Ganhei o apelido numa escola estadual de Belo Horizonte. É um nome que usava para poder pichar e também porque comprava umas balas num lugar chamado Sweet Sweet Way. Então, ficou assim. Eternamente Sweet.
Parti então para um momento da conversa sobre como tudo começou e como foi que Bárbara se interessou pela música. Sweet nos conta que o seu primeiro contato foi quando participou de um Coral na Igreja, algo bem diferente de hoje, quando tinha 11 anos.
O Coral foi a primeira ligação que eu tive com a música, na forma de cantar, aprender sobre afinação e conhecimento da minha voz. Eu tinha mais ou menos uns 11 anos. E esse foi meu primeiro contato. Com uns 12 anos mais ou menos comecei a me envolver com o Rap, comecei a escutar algumas coisas, colar em algumas festas. Eu também tocava com uma galera que era mais voz e violão, mas aí entrei no Rap e me encantei pelo negócio.
Falar de música e suas influências também estava dentro da minha listinha de perguntas e curiosidades sobre essa moça. Conversamos sobre o que a artista escuta, seu background e quais são seus sons preferidos.
Escuto muita coisa brasileira. Muita coisa antiga. Samba. Escuto Blues. Tem uma playlist da Tássia, que sempre esqueço o nome, mas é muito boa, rs. Música é música. O próprio Rapper ele precisa beber na fonte de outros artistas, de outros gêneros. No Rap estou escutando a Tássia Reis, ela é foda. A Erikah Badu. Para eu conseguir produzir, preciso de outras referências.
A questão do empoderamento da mulher na música e mais adentro, no mundo do Rap, ainda é um espaço de muito preconceito e machismo. Bárbara nos contou que em um dia de suas primeiras batalhas, em 2009, foi assediada e que isso a deixou mal por um bom tempo voltando apenas em 2012 aos palcos. Ela frisa que por isso é importante a questão da representatividade ser pautada a todo momento.
Em uma batalha aqui em Belo Horizonte num duelo com um moleque que na época estava mandando muito na cena, de repente, ele começou a falar dos meu peitos e eu tinha acabado de amamentar. Então fiquei muito na bad por isso, voltei só depois em 2012. Mas quando voltei não parei mais.
O discurso empoderador veio para ficar. E agora ninguém segura mais as minas do rap. E nem qualquer mina, diga se de passagem! Ela nos conta que é preciso representatividade e que o espaço para mulheres ainda é bem baixo, mas é aquele trabalho de formiguinha que já está alcançando bons ventos. Meninas que sempre tiveram a vontade de batalhar ou serem Mc’s não sentem mais medo ou vergonha de se expressar.
Esse espaço melhorou muito. Quando eu entrei no Rap há 10 anos atrás esse ambiente para as mulheres era praticamente nulo. Eu só via as minas junto com os caras, acompanhadas e não participando. Nunca sozinha. Eram pouquíssimas mulheres que eu via no palco sozinha. Hoje esse espaço, que por mais que ainda seja a base de luta, a gente vem conquistando. Eu vejo as minas se organizando. Vejo elas se manifestando. Está crescendo. Quanto mais a gente se apóia, mas mulheres se juntam à nós. É a questão clássica da representatividade. Muitas meninas não tem vergonha de participar, mas tem um certo receio de passar por aquilo que passei quando o cara falou dos meus peitos. Somos criadas para ter um complexo com o nosso corpo, então quando alguém fala isso no meio de uma batalha é muito complicado. Ouvir alguém falando da sua imagem de forma brutal na frente de várias pessoas é muito duro. As mulheres já estão se libertando disso na batalha. É um passo. Ver outras mulheres na cena, faz com que as meninas tenham o direito de se expressar como que querem, plenamente.
Para Bárbara, uma batalha em especial e que foi O DIVISOR de águas é a do Santa Cruz em São Paulo, que acontece todo sábado, às 20h ao lado do metrô Santa Cruz. Um fato interessante dessa batalha em especial foi quando seu adversário falou algo que podia ter ido dormir sem mencionar. Alguma coisa como: Eu não sou machista e foda-se as feministas. (WTF?)
Sweet me conta que é fundamental se preparar e conhecer seu adversário. Ter uma estratégia em mente para o que você for falar ser inteligente. E na pegada do Freestyle, quem não conhece o adversário pode se dar mal e ficar muito difícil contornar a situação. Pesquisar com quem você vai lidar é fundamental, tem que ter uma estratégia para montar a rima perfeita. Foí que seu adversário se deu mal.
https://www.youtube.com/watch?v=Gl5JRbih_Ac
Wow!
A batalha de MC’s muitas vezes é um espaço extremamente misógino. Essa resposta deu muita força para as mulheres, que acharam extremamente empoderador eu conseguir responder a altura. Deu uma reflexão grande para o mundo do Rap. Eu notei uma transformação de vários amigos depois disso. Algumas coisas nessa batalha não precisavam ser ditas, pela parte deles. A batalha é um MMA da mente. Você tem saber no que o seu adversário é bom ou ruim. Por exemplo, se algum dia você for batalhar com uma pessoa gorda e chamar ela gorda, você já perdeu. O ponto não é esse. A mesma coisa em relação a mulher. Você vai batalhar com uma mulher e diminuir ela porque ela é uma mulher? A chance de você perder é grande, pois afinal, ela é uma especialista em ser mulher. Então foi feito o debate dos caras ir além disso. De pensar fora da caixa e não contar com esse discurso de mandar a mulher lavar louça e etc. Foi bem legal! O debate e a minha visibilidade também.
Além de tudo isso, Bárbara também tem uma projeto chamado Liga Feminina das MC’S que abrange todos os estados brasileiros, como se fosse um duelo nacional, porém só com mulheres. Ela fala também sobre a falta de apoio e dificuldade de fazer um projeto tão importante como esse.
Nós ainda não temos um projeto de lei ainda. Então trazer essas mulheres e reuni-lás em BH é duro. Pois temos que conseguir hospedagem, passagem, tudo isso. Mas a gente taí batalhando porque é isso é muito transformador, sabe? Aqui em Minas Gerais, conseguimos reunir 10 MC’s para fazer essas batalhas e depois disso várias outras meninas foram surgindo, participando da cena da cidade. Algumas que não quiseram mais foram fazer shows. Pô, quando começamos isso, há um ano atrás não tinha nenhuma mulher fazendo show na minha cidade, inclusive eu! E agora, você pega um final de semana e tem pelo menos, duas ou três meninas fazendo show de rap. Então isso foi transformador. As mulheres se reuniram, se conectaram, conhecemos outras mulheres. E eu observo isso em outros estados também. Na Bahia, em São Paulo, então é isso. São mulheres de diversas ramificações do hip hop lutando pelo mesmo objetivo.
Em 2016, Bárbara vem com tudo! Seu grande trunfo é o primeiro disco intitulado D.O.C.E – Doce Ostensiva de Caligrafia Explícita – Ainda está na produção, mas prometido para 2016. Vamos aguardar ansiosamente aqui, Sweet! Para finalizar, ela deu uma dica para meninas que querem seguir a carreira de rapper. O lance é sobre meter a cara e fazer acontecer. Como Bárbara disse, o espaço está mudando e muitas meninas já estão sendo protagonistas dessa história.
Minha dica para meninas é que não fraquejem. Freestyle é treinamento. Nós temos uma vantagem, porque a gente já sabe o que é sofrer. Então se quiser fazer uma batalha, pensa nas 100 mulheres que sofreram algum preconceito naquele dia. Na verdade, na hora, você não está falando por você e por várias mulheres que estão numa situação ruim.
Inspirador e incrível! Bom para pensar que a cena musical do rap e hip hop está deixando de ser frequentada e protagonizada apenas por homens. Que o movimento continue. E que apareçam mais Bárbaras Sweets.